domingo, 25 de dezembro de 2011

O paradoxo do nosso tempo (George Carlin)

O paradoxo do nosso tempo é que temos edifícios mais altos e temperamentos mais reduzidos; estradas mais largas e pontos de vista mais estreitos. Gastamos, mas temos menos; compramos mais, mas desfrutamos menos.

Temos casas maiores e famílias menores; mais conforto e menos tempo. Temos mais graduações acadêmicas, mas menos sentimentos comuns. Temos maior conhecimento, mas menor capacidade de julgamento; mais peritos, mas mais problemas; melhor medicina, mas menor bem-estar.

Bebemos demasiado, fumamos demasiado, desperdiçamos demasiado, rimos muito pouco; movemo-nos muito rápidos, nos irritamos demasiado. Mantemo-nos muito tempo acordados, amanhecemos cansados. Lemos muito pouco, assistimos televisão demais e oramos raramente.

Falamos demasiado, amamos demasiado pouco e odiamos muito frequentemente. Aprendemos a ganhar a vida, mas não a vivê-la. Adicionamos anos às nossas vidas, não vida aos nossos anos. Multiplicamos nossos bens, mas reduzimos nossos valores.

Conseguimos ir à Lua e voltar, mas temos dificuldade em cruzar a rua para conhecer um novo vizinho. Conquistamos o espaço exterior, mas não o nosso interior.

Temos feito grandes coisas, mas nem por isso melhores.

Limpamos o ar, mas contaminamos a nossa alma; dominamos o átomo, mas não os nossos preconceitos. Escrevemos mais, mas aprendemos menos; planejamos mais, mas realizamos menos.

Aprendemos a apressar-nos, mas não a esperar. Produzimos computadores que podem processar mais informação e difundi-la, mas nos comunicamos cada vez menos e menos.

Estamos na era do fast-food e da digestão lenta; de homens de grande estatura e de pequeno caráter; dos lucros econômicos acentuados e das relações humanas superficiais.

Hoje em dia, há dois ordenados, mas mais divórcios; casas mais chiques e lares despedaçados. São tempos de viagens rápidas, fraldas descartáveis, moral descartável, encontros de uma noite e pílulas que fazem tudo, desde alegrar e acalmar, até matar.

Um momento em que há muito na vitrine e muito pouco na dispensa. Tempos em que a tecnologia lhe encaminha esta carta, permitindo partilhar tais reflexões ou simplesmente excluí-las.

Lembre-se de passar algum tempo com as pessoas que estima, pois elas não estarão por aqui para sempre. Lembre-se de ser amável com quem agora lhe admira, porque essa pessoa crescerá muito rapidamente e se afastará de você.

Lembre-se de abraçar quem está perto de você, porque esse é o único tesouro que pode dar com o coração, sem que custe nem um centavo. Lembre-se de dizer “te amo” ao seu companheiro e aos seus entes queridos, mas, sobretudo, diga com sinceridade.

Um beijo e um abraço podem curar uma ferida, quando se dão com toda a alma. Dedique tempo para amar e para conversar, bem como partilhe suas idéias mais apreciadas.

E nunca esqueça: a vida não se mede pelo número de vezes que respiramos, mas pelos extraordinários momentos que passamos juntos.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Quem são os irracionais? (Bruno Momesso Bertolo)

Sexismo, racismo, xenofobia, homofobia, intolerância religiosa, discriminação etária, discriminação de portadores de deficiências, dentre outras distinções humanas, são muito conhecidas.

E o especismo? O que é? Referido termo foi criado em 1970 por Richard D. Ryder, filósofo e psicólogo britânico, em seu livro “Vítimas da Ciência”.

É, em apertada síntese, a discriminação fundada na diferença das espécies, atribuindo valores ou direitos a determinado ser vivo conforme a espécie a qual pertence. Pode haver, ainda, uma discriminação dentro da discriminação, pois alguns especistas, por exemplo, consideram anfíbios e peixes menos importantes que os mamíferos.

Por qual razão separamos humanos, que também são animais, dos demais seres da Terra?

O principal pretexto seria a racionalidade. Sem dúvidas, nosso intelecto desenvolvido é uma diferença notável, representando, ainda, uma capacidade de nos sobrepormos às outras espécies. Uma capacidade, não um direito.

Como corolário, temos um encargo ainda maior com as espécies diferentes, já que nossas ações decorrem de uma escolha, que pode ser refletida, impulsiva ou inconsciente, sendo que tal responsabilidade não recai sobre os outros organismos. Comprometemos a todos, embora as opções sejam só nossas.

De outro flanco e lamentavelmente, diversos cientistas defendem que os denominados animais irracionais, por possuírem psique menos evoluída em relação a nós, são desprovidos de sentimentos, de modo que não entenderiam o sofrimento, a felicidade e/ou o amor, por exemplo.

Sob a batuta de sobredito e falacioso argumento, ainda vemos animais sendo aprisionados, torturados e mortos como objetos de entretenimento, como ocorre nos nefastos rodeios, touradas, circos e zoológicos. Conforme dito por Julia Allen Field, “não podemos ver a beleza essencial de um animal enjaulado, apenas a sombra de sua beleza perdida”.

Se não bastasse, ainda utilizam animais como cobaias, para testes de vários ramos industriais, mormente o de cosméticos e farmacêuticos, os quais empregam técnicas extremamente cruéis e desnecessárias, tais como a vivissecção (dissecação de animais vivos), experiências tóxicas e outros tormentos deliberados com pseudos fins científicos.

Somos melhores e/ou mais importantes? Sob qual fundamento e legitimidade? A meu ver, os humanos certamente não são mais importantes e, quiçá, nem melhores.

Com efeito, há animais que cuidam de sua prole com maior esmero e amor do que muitas pessoas, que, não raro, abandonam seus filhos por motivos fúteis, como ocorre, por exemplo, com o genitor que não aceita um descendente deficiente ou então com aquele que não paga pensão alimentícia.

Não acredito que se trate de mero instinto, como muitos apregoam. Basta lembrarmos o modo que um primata – nossos parentes mais próximos – segura sua cria, repleto de carinho e dedicação. Ou da alegria e fidelidade de um cachorro, quando seus donos retornam depois de um dia de trabalho.

Ademais, bichos não possuem vícios e defeitos inerentes ao Homo sapiens, como egoísmo, narcisismo, inveja, agressividade, entre outros. Abelhas e formigas vivem em perfeita harmonia em sociedade, o que não ocorre na civilização humana, abarrotada de guerras, delitos e discórdias.

Sejamos ponderados: irracionais são os humanos, que degradam o meio ambiente, colocando em risco a existência de todas as espécies do planeta. Não merecemos, portanto, o título de dominantes. Talvez façamos jus à pecha de domínio do mal.

A humanidade não gostaria de ser subjugada por extraterrestres. De igual forma, ponhamo-nos no lugar que destinamos atualmente aos outros seres da Terra e perceberemos como somos desumanos. É um paradoxo, mas é a verdade.

Por fim, encerro com uma citação, sempre proferida ao final do programa “TV Animal”, que ilustra impecavelmente o que penso: “Chegará o dia em que o homem conhecerá o íntimo de um animal. E, nesse dia, todo crime contra um animal será um crime contra a humanidade”.

domingo, 27 de novembro de 2011

A idade e a mudança (Lya Luft)

Mês passado participei de um evento sobre as mulheres no mundo contemporâneo. Era um bate-papo com uma platéia composta de umas 250 mulheres de todas as raças, credos e idades.

E por falar em idade, lá pelas tantas, fui questionada sobre a minha e, como não me envergonho dela, respondi. Foi um momento inesquecível... A platéia inteira fez um 'oooohh' de descrédito.

Aí fiquei pensando: “pô, estou neste auditório há quase uma hora exibindo minha inteligência, e a única coisa que provocou uma reação calorosa da mulherada foi o fato de eu não aparentar a idade que tenho? Onde é que nós estamos?”.

Onde não sei, mas estamos correndo atrás de algo caquético chamado “juventude eterna”. Estão todos em busca da reversão do tempo. Acho ótimo, porque decrepitude também não é meu sonho de consumo, mas cirurgias estéticas não dão conta desse assunto sozinhas.

Há um outro truque que faz com que continuemos a ser chamadas de senhoritas mesmo em idade avançada. A fonte da juventude chama-se "mudança".

De fato, quem é escravo da repetição está condenado a virar cadáver antes da hora. A única maneira de ser idoso sem envelhecer é não se opor a novos comportamentos, é ter disposição para guinadas. Eu pretendo morrer jovem aos 120 anos.

Mudança, o que vem a ser tal coisa?

Minha mãe recentemente mudou do apartamento enorme em que morou a vida toda para um bem menorzinho. Teve que vender e doar mais da metade dos móveis e tranqueiras, que havia guardado e, mesmo tendo feito isso com certa dor, ao conquistar uma vida mais compacta e simplificada, rejuvenesceu.

Uma amiga casada há 38 anos cansou das galinhagens do marido e o mandou passear, sem temer ficar sozinha aos 65 anos. Rejuvenesceu.

Uma outra cansou da pauleira urbana e trocou um baita emprego por um não tão bom, só que em Florianópolis, onde ela vai à praia sempre que tem sol. Rejuvenesceu.

Toda mudança cobra um alto preço emocional. Antes de se tomar uma decisão difícil, e durante a tomada, chora-se muito, os questionamentos são inúmeros, a vida se desestabiliza.

Mas então chega o depois, a coisa feita, e aí a recompensa fica escancarada na face.

Mudanças fazem milagres por nossos olhos, e é no olhar que se percebe a tal juventude eterna. Um olhar opaco pode ser puxado e repuxado por um cirurgião a ponto de as rugas sumirem, só que continuará opaco porque não existe plástica que resgate seu brilho.

Quem dá brilho ao olhar é a vida que a gente optou por levar. Olhe-se no espelho...

domingo, 6 de novembro de 2011

“Ecologizar” é preciso (Bruno Momesso Bertolo)

Recentemente, conforme estimativas, a população mundial atingiu a marca de 7 bilhões de pessoas. A cada segundo, 5 seres humanos nascem em todo o mundo, totalizando, portanto, 432.000 habitantes a mais por dia. Tais números são, no mínimo, preocupantes. Nos últimos dias, a indagação maior foi se haverá alimento para os mencionados 7 bilhões. A meu ver, a questão deveria ser outra: a Terra suportará tantos humanos?

Afinal, nossa presença no planeta (equivalente a 2 minutos se a idade da Terra fosse resumida em 365 dias) se assemelha a de um parasita, o qual exaure todos os recursos de seu hospedeiro, até levá-lo à morte. Tanto é assim que a comunidade científica, especialmente os geólogos, cogitam instituir uma nova era geológica, denominada Antropoceno, atrelada aos impactos ambientais causados pelo homem. Em outras palavras, seremos equiparados ao meteoro que extinguiu os dinossauros. E não é à toa.

Por dia, uma pessoa produz aproximadamente 5 quilos de lixo. No Brasil são gerados, diariamente, 240.000 toneladas de lixo. 90% de aludida quantia é destinada a aterros sanitários. Até quando será possível empurrar nossa sujeira para debaixo do tapete?

Infelizmente, a reciclagem no país limita-se às latas de alumínio, da qual somos recordistas mundiais, em razão de necessidade financeira de muitos catadores, não da conscientização ecológica. Com efeito, a reciclagem brasileira de papéis, plásticos e vidro, materiais altamente poluentes e amplamente utilizados, é pífia.

É sempre oportuno lembrar: 50 quilos de papel reciclado poupa uma árvore; 50 quilos de alumínio reciclado evita a extração de 5 toneladas de bauxita; 1 quilo de vidro reciclado gerará outro quilo de vidro, economizando muita energia. Ademais, uma garrafa de vidro ou plástico pode demorar até 1 milhão de anos para se decompor.

Há inúmeras maneiras de mitigarmos o dano ambiental decorrente das atividades humanas. Algumas são conhecidas, embora sejam pouco aplicadas. Evitar o desperdício de água e energia, por exemplo. Outras não são tão divulgadas, porém basta pesquisar sobre o assunto para obter alternativas simples e/ou novas condutas. Calibrar os pneus dos veículos semanalmente, por exemplo, reduz o consumo de combustível.

Não adianta reclamar da inércia estatal e/ou empresarial. Façamos a nossa parte! Se informe e notará que não é difícil ajudar. Pequenas contribuições multiplicadas fazem toda a diferença. Requer alguma disciplina e perseverança adotar novos comportamentos, entretanto, em pouco tempo, tornar-se-ão hábitos. Propague a ideia entre amigos e familiares.

Parafraseando Luís Vaz de Camões, brilhante poeta que em sua época assinalava que “navegar é preciso”, enfrentamos um novo limiar: “ecologizar” é preciso. Ou adotamos posturas ecologicamente corretas, ou então a Terra efetivará as providências necessárias para o equilíbrio natural. E o final não será feliz para nós. O homo sapiens precisa da Terra, porém a recíproca não é verdadeira.

Nosso planeta tem nos alertado por meio de diversos sinais. Já passou da hora de prestarmos atenção. Se não o faremos por consciência ao meio ambiente e às demais espécies, façamos por um ato primitivo, instintivo e um tanto egoísta: a autopreservação.

E não esqueça de reciclar este texto. Agradeço desde já!

domingo, 30 de outubro de 2011

Sociedade sem graça (José de Souza Martins)

A variedade e a frequência da violência que nos assombra constitui indício de profundas e alarmantes mudanças sociais fora de controle: pais que matam filhos, filhos que matam pais, netos que matam avós, bebês que são jogados no lixo, bêbados que dirigem carros em alta velocidade e matam. E mesmo humoristas que querem fazer rir à custa do desrespeito e do menosprezo pelo outro. A sociedade está ficando sem graça. Só há graça na reciprocidade de valores sociais em contraposição à tentação de conveniências pessoais. Nossa tradição de humor é de raiz conservadora e se baseia, sobretudo, em fazer rir das contradições próprias das insuficiências da nossa modernidade, do imitar sem ser ou do ser sem saber. Daí que o caipira seja o nosso sujeito crítico por excelência e nosso insuperável personagem de humor.

A sociedade dos incalculáveis ganhos econômicos tornou-se a sociedade das incalculáveis perdas morais. Falta uma bolsa de valores sociais, que meça diariamente quanto perdemos de nós mesmos, de nossa dignidade, de nossa autoestima, da estima e do respeito pelo outro. A sociedade do pendão da esperança está se transformando na sociedade da desesperança e do ceticismo.

Já há uma rotina de notícias sobre pessoas embriagadas que, dirigindo carro, atropelam, machucam e matam. Vamos nos acostumando, que é o pior sinal da complacência e da rendição incondicional à banalização da vida. Assassinos do volante foram soltos até antes que suas vítimas fossem enterradas. Edson Roberto Domingues, 55 anos, trabalhador, negro, chefe de família, teve 90% do corpo queimado quando seu caminhãozinho foi batido, e pegou fogo, pelo carro Camaro, importado, de R$ 165 mil, dirigido por um jovem embriagado, em disparada, que feriu quatro outras pessoas. Naquela rua a velocidade máxima é de 60 km por hora, que Edson Roberto respeitava. Foi vitimado por um bêbado irresponsável que corria a 116 km por hora. Mediante fiança de R$ 245 mil, o autor da violência foi solto 24 horas antes da morte de sua vítima e dois dias antes que a família a enterrasse no Cemitério da Lapa.

O respeitador da lei foi irremediavelmente punido, como se fosse o culpado; o violador da lei passou umas horas na cadeia e está livre, como se fosse vítima. O assassino vai ser julgado por homicídio doloso, mas o STF já tem decisão sobre outro caso do mesmo gênero, de 2002, em que o dolo é questionado. Como observou um especialista, uma pena que deveria ser de 20 anos de prisão acaba sendo, no máximo, de 4 anos e até trocada por cestas básicas para os pobres. Quando o dinheiro pode pagar por aquilo que não tem preço, quando vida e moeda se equivalem, já significa que nessa equivalência a condição humana se perdeu. O abrandamento do Código de Processo Penal, para casos assim, vai na mesma direção.

História igual ao do dono do Porsche de R$ 600 mil que abalroou e destruiu o carro dirigido por uma moça, matando-a. Salvo por um bombeiro, ele saiu dos escombros de seu carro preocupado unicamente com os danos ao seu veículo. Nossa alma foi mercantilizada no egoísmo da equivalência mercantil do que não é equivalente ou não deveria ser.

Os longos anos de ditadura, de falta de liberdade e de direitos, deram lugar a uma sociedade que se embriaga na falsa concepção de que a liberdade só existe no abuso da liberdade sem freios, sem regras, sem respeito pela liberdade do outro. De que o direito só o é no abuso do direito sem a contrapartida de um código de deveres, os do respeito pelo direito do outro. A democratização corre o risco de se tornar uma farsa na anomia que desagrega, na falta de normas decorrentes de valores sociais de referência. Esses casos sugerem que os valores estão invertidos, pervertidos.

O eixo do nosso senso de justiça vem se deslocando do que por longo tempo definiu os valores sociais e regulou o comportamento das pessoas, a sociedade valorizada como todo. A sociedade tinha a primazia na definição do certo e do errado, do bem e do mal. É verdade que a vara de marmelo teve uma função histórica na formação do caráter do brasileiro, até a geração de nossos pais e avós. O Brasil venceu essa fase repressiva e descabida e começou a formar seus filhos na brandura da compreensão, na honestidade pedagógica de falar, mas de também ouvir.

Mas essa revolução de perspectiva não levou em conta os trânsfugas da educação tradicional e da moderna, os que confundiram liberdade com abuso, direito com prepotência, democracia com impunidade. Chegamos ao tempo cinzento das novas iniquidades, o do direito torto, da lei capciosa, da lei de Gerson, do individualismo exacerbado, da solidão que cega. Em larga extensão, a sociedade brasileira está matando o outro e o sentido da alteridade e da reciprocidade. "Deus é brasileiro" foi frase comum na boca de todos durante um longo tempo de nossa história. Mas Deus morre todos os dias não só nos atos dos que a si mesmos se supõem deuses; também nas várias modalidades de aniquilamento do semelhante.

domingo, 2 de outubro de 2011

Reflexões sobre o 11 de setembro (Bruno Momesso Bertolo)

11 de setembro. Uma data marcante. Neste dia, em 1.973, um golpe militar no Chile, apoiado e financiado pelos Estados Unidos da América, depôs e assassinou o Presidente da República, Salvador Allende, implantando uma das ditaduras mais cruéis (estimativa de 40.000 vítimas) da América Latina, comandada por Augusto Pinochet.

Infelizmente, supramencionado 11/09 é olvidado, como se nunca tivesse ocorrido. Esta data é associada, em regra e de imediato, aos ataques terroristas de 2.001, acontecidos nas cidades de Nova Iorque e Washington, que vitimaram cerca de 3.000 pessoas.

Os motivos são desconhecidos, mas pouco ou quase nada se comenta acerca de todos os fatos que desencadearam no 11 de setembro de 2.001.

Por que se omite que Osama Bin Laden e a Al-Qaeda receberam treinamento, suporte financeiro e militar da CIA, para combaterem os soviéticos no Afeganistão durante a década de 80? Por que se oculta que George W. Bush recebeu um relatório do FBI em agosto de 2.001, alertando para possíveis ataques terroristas de elevadas proporções e com a utilização de aviões, mas que nada foi feito para evitar a tragédia?

Ademais, o maior atentado terrorista da História, na verdade, deu-se em 6 de agosto de 1.945, quando uma bomba atômica, despejada pela Força Aérea dos EUA, explodiu em Hiroshima, dizimando aproximadamente 140 mil pessoas em um átimo. Se não bastasse, ainda haveria, 3 dias depois, outra explosão nuclear, desta vez em Nagasaki, onde outras 80 mil vidas foram eliminadas instantaneamente. Outros milhares faleceriam em razão dos efeitos radioativos, os quais ainda geram deformidades e enfermidades no país nipônico.

Neste ponto, urge lembrar que o Japão sinalizava uma rendição, porém os EUA ignoravam os indícios, principalmente porque almejavam testar o nefasto armamento nuclear em uma população, bem como para demonstrar ao mundo e à União Soviética seu poderio militar.

Como se percebe, há várias reflexões sobre o 11 de setembro.

Todavia, neste domingo, serão lembrados, unicamente, os 10 anos do atentado de 2.001, com a reiteração infindável de cenas cinematográficas, em vários ângulos, das explosões dos aviões e das ruínas das torres gêmeas. Contar-se-á, uma vez mais e apenas, o fim da história. Esquecer-se-á, de novo e deliberadamente, de relatar os atos que contribuíram e/ou ensejaram aquela situação.

Afinal, tais ataques são consequência e reação, não uma mera afronta à liberdade e/ou paz dos Estados Unidos, supostos paladinos destes valores, como muito se apregoa pela mídia ocidental. São, sem dúvidas, frutos da política externa belicista do governo estadunidense, apoiada pela maioria do povo, cuja cultura parece idolatrar a guerra.

Basta lembrar que tiranias e/ou golpes de estado receberam e recebem apoio e/ou financiamento dos EUA, dentre os quais se destacam os governos teocráticos árabes (alguns envolvidos atualmente em constantes revoltas por direitos civis), grandes aliados por fornecerem um importante produto à economia ianque: o petróleo.

Saddam Hussein, por exemplo, era estimado parceiro político estadunidense, sendo financiado para combater os iranianos entre 1.980 e 1.988, tornando-se inimigo apenas quando invadiu o Kuwait, uma vez que este país se recusava a diminuir a produção de petróleo para aumentar o preço do barril no mercado, algo que ditador iraquiano almejava.

São fatos registrados pela História, embora sejam pouco divulgados. Os EUA foram e são fomentadores do terrorismo em várias partes do mundo. Portanto, ao menos com relação aos ataques de 11/09, é necessário dizer: os estadunidenses se tornaram vítimas de sua própria cria.

Toda vida ceifada, independentemente de nacionalidade, merece respeito e condolências. Porém, não devemos compactuar com a ideia de que o 11 de setembro de 2.001 se resume, pura e simplesmente, a um ato de fanatismo religioso. Engloba, sobretudo, interesses políticos e econômicos de governos e empresas. Não se relacionam com direitos, liberdade ou paz, vestes utilizadas, não raro, para legitimar guerras, como ocorreu no Afeganistão e no Iraque após o 11/09/2001.

domingo, 4 de setembro de 2011

De céticos a cínicos (Emir Sader)

O ceticismo parece um bom refúgio em tempos em que já se decretou o fim das utopias, o fim do socialismo, até mesmo o fim da história. É mais cômodo dizer que não se acredita em nada, que tudo é igual, que nada vale a pena. O socialismo teria dado em tiranias, a política em corrupção, os ideais em interesses. A natureza humana seria essencialmente ruim: egoísta, violenta, propensa à corrupção.

Nesse cenário, só restaria não acreditar em nada, para o que é indispensável desqualificar tudo, aderir ao cambalache: nada é melhor, tudo é igual. Exercer o ceticismo significa tratar de afirmar que nenhuma alternativa é possível, nenhuma tem credibilidade. Umas são péssimas, outras impossíveis. Alguns órgãos, como já foi dito, são máquinas de destruir reputações. Porque se alguém é respeitável, se alguma alternativa demonstra que pode conquistar apoios e protagonizar processos de melhoria efetiva da realidade, o ceticismo não se justificaria.

Na realidade o ceticismo se revela, rapidamente, na realidade, ser um cinismo, em que tanto faz como tanto fez, uma justificativa para a inércia, para deixar que tudo continue como está. Ainda mais que o ceticismo-cinismo está a serviço dos poderes dominantes, que costumam empregar esses otavinhos, dando-lhes espaço e emprego.

Seu discurso é que o mundo está cada vez pior, à beira da catástrofe ecológica, tudo desmorona e outros cataclismos. Concitam a essa visão pessimista, ao ceticismo e a somar-se à inercia, que permite que os poderosos sigam dominando, os exploradores sigam explorando, os enganadores – como eles – sigam enganando.

Por mais que digam que tudo está pior, que o século passado foi um horror – como se o mundo estivesse melhor no século XIX
, que nada vale a pena, não podem analisar a realidade em concreto. Para não ir mais longe, basta tomar a América Latina – tema sobre o qual a ignorância dessa gente é especialmente acentuada. Impossível não considerar que o século XX foi o mais importante da sua história, o primeira em que a região começou a ser protagonista da sua historia. De economias agro exportadoras, se avançou para economias industrializadas em vários países, para a urbanização, para a construção de sistemas públicos de educação e de saúde, para o desenvolvimento do movimento operário e dos direitos dos trabalhadores.

Mas bastaria concentrar-nos no período recente, no mundo atual, para nos darmos conta de que as sociedades latino-americanas – o continente mais desigual do mundo – ou pelo menos a maioria delas, avançaram muito na superação das desigualdades e da miséria. Ainda mais em contraste com os países do centro do capitalismo, referência central para os cético-cínicos, que giram em falso em torno de políticas que a América Latina já superou.

Mas o ceticismo-cinismo desconhece a realidade concreta, não conhece a história. É pura ideologia, estado de ânimo, que dá cobertura aos poderosos, lado que escolheram, ao optar por deixar o mundo como ele está. Trata de passar sentimentos de angustia diante dos problemas do mundo, mas é apenas uma isca para fazer passar melhor seu compromisso com que o mundo não mude, continue igual. Até porque a vida está bem boa para eles que comem da mão dos ricos e poderosos.

Ser otimista não é desconsiderar os graves problemas de toda ordem que o mundo vive, não porque a natureza humana seja ruim por essência, mas porque vivemos em um sistema centrado no lucro e não nas necessidades humanas – o capitalismo, na sua era neoliberal. Desconhecer as raízes históricas dos problemas, não compreender que é um sistema construído historicamente e que, portanto, pode ser desconstruído, que teve começo, tem meio e pode ter fim. Que a história humana é sempre um processo aberto de alternativas e que triunfam as alternativas que conseguem superar esse ceticismo-cinismo que joga água no moinho de deixar tudo como está, pela ação consciente, organizada, solidária dos homens e mulheres concretamente existentes.

domingo, 7 de agosto de 2011

Brasil, Noruega e seus cordeiros mortos (Wiki Repórter Cesar)

A primeira morte no massacre da Noruega foi causada pelo maluco assassino.

Todas as demais mortes foram causadas pela estupidez dos desarmamentistas, pela famigerada cultura de submissão e covardia propagada por covardes pacifistas com seus ideais “politicamente corretos”.

Recapitulando: depois do ataque à bomba contra o escritório do primeiro-ministro, o psicopata atacou q tiros o acampamento de jovens do Partido Trabalhista na Ilha de Utoya, a 40 km de Oslo, deixando mais oitenta e cinco mortos.

Haviam 560 pessoas naquela ilha, e o único policial ali, não portava armas (proibido por lei a todos), e foi o primeiro a ser morto.

Horrível, monstruoso? Sim. Inevitável? Não.

É o resultado da submissão e covardia, que transformam o cidadão num debilóide incapaz e sempre dependente das instituições do Estado.

É o velho plano da escravização socialista, sonhado ainda pelos meliantes dos anos 70, que nos governam hoje.

Essa ideologia de renuncia ao direito e à capacidade de defender sua família, sua propriedade e sua própria vida, torna o indivíduo fraco, submisso e covarde; entregando toda a responsabilidade ao governo, à polícia e ao Judiciário e abrindo mão de seus meios de defesa – especialmente as armas. Limita-o a gritar debilmente: “sou da paz” e a pensar que cumpriu seu dever livrando-se do brio e da coragem.

Não reaja”, dizem os maus políticos, a grande mídia e as ONGs pra lá de suspeitas. “Nem olhe para o bandido, para que ele não tema que você o reconheça”. “Nunca ande completamente sem dinheiro, mas sempre leve algum para que o ladrão não fique irritado”.

Discurso bonitinho, mas prejudicial. Na prática torna você uma vítima indefesa, dependendo da misericórdia de pessoas de má índole. O resultado é cada vez mais, freqüentemente, ser morta a vítima indefesa, mesmo sem reagir.

O que aconteceu na Noruega?

Havia 560 pessoas na ilha e apenas um atirador. Ninguém reagiu. Seriam 560 contra um. Mesmo assim o maluco solitário matou 85 pessoas e saiu ileso e sorridente. O agressor agiu livremente por uma hora e meia sem que ninguém lhe oferecesse qualquer resistência. Todos ficaram aguardando a chegada de um salvador.

Para pelo menos 85 deles, o salvador nunca chegou (havia um policial dando a segurança e, alegrem-se os pacifistas das ONG, totalmente desarmado). Foi o primeiro a ser abatido.

Quinhentas e sessenta pessoas entraram em pânico e tentaram fugir sem sequer pensar em reagir, alguns se escondendo atrás de pedras, outros se jogando ao mar, outros se escondendo no banheiro.

Outros, paralisados de medo, só não foram abatidos por sorte. Enquanto o agressor gritava que ia matar todo mundo, passeando entre corpos de vítimas já abatidas, alguns se fingiram de mortos.

Houve até quem usasse outras pessoas como escudos humanos, tremendo de medo enquanto seus amigos eram alvejados e seus corpos caiam sobre ele.

Como é possível que ele tenha permanecido uma hora e meia atirando sem que ninguém entre cerca de 560 pessoas tenha gritado “PRA CIMA DELE, TODO MUNDO!”???

Resposta: porque, mais do que no Brasil, na Noruega a população é doutrinada segundo a cultura de submissão e covardia que os torna incapazes de lutar até mesmo por suas vidas. Deixam-se matar sem combater, como cordeiros, e o lobo nem se importa com o número dos cordeiros.

Entretanto, mesmo alguns animais são capazes de atitudes muito mais dignas, solidárias e coordenadas. Enquanto cordeiros e veados procuram apenas fugir, os búfalos, os porcos do mato e mesmo os pequenos macacos prego, por vezes atacam em grupo, furiosamente ao agressor de um deles. Não se deixam abater pelo medo.

Sua dignidade e sua coragem superaram o temor. Naturalmente, não estariam dispostos a abrir mão de usar suas armas, mesmo que sejam os pequenos dentes do macaco prego. Agora, se você entra num galinheiro para pegar uma galinha, nenhuma outra o enfrentará. Procurarão apenas salvar a pele.

O que aconteceu no massacre na escola em Realengo?

Aqui, em nosso país, o massacre de Realengo só foi interrompido pela arma de um sargento da PM. Não fosse esse policial, que entrou pelos corredores onde só se ouviam disparos, choros e gritos, o numero de vítimas seria incalculável, pois ainda havia muitas crianças para serem mortas e munição não faltava ao psicopata.

Mas tinha um homem que chegou e encerrou a tragédia porque portava uma arma. Era um policial, mas poderia ser um professor, ou qualquer cidadão honesto que portasse uma arma.

Ninguém pode esperar que se coloque um policial em cada sala de aula. Foi sorte aquele policial ter sido encontrado por uma criança a três quadras dali, mesmo assim chegou tarde para doze crianças.

Houvesse um policial na escola, certamente o psicopata o teria morto a traição antes do massacre. Apenas uma cultura de reação e pessoas armadas o poderiam ter evitado.

Ainda em nosso país, há algum tempo atrás, um maluco, estudante de medicina, sob efeito de remédios, iniciou um massacre em um cinema. Não me lembro quantos matou, mas várias pessoas, ignorando o medo, pularam em cima e o dominaram.

É assim que se faz; melhor teria sido se algumas dessas pessoas honradas tivessem armadas. Naturalmente, a mídia desestimula: “É perigoso reagir”. Mais perigoso é se deixar matar.

Na Noruega, país de população ambientalista, parece ter perdido a referência da realidade na tentativa pacifista de "interagir" com criminosos e animais selvagens, todo mundo é da "paz"

Na Suíça, isso teria sido diferente; o psicopata cairia rapinho, morto no chão. A Suíça é um pais pacífico, mas é o mais armado a nível de cidadania civil. Pacífico, não pacifista. Tranqüilo, não covarde. Se, na Noruega, um estivesse armado no meio da confusão, a tragédia seria menor, mas lá o cidadão não pode ter armas. Nem a polícia. A Noruega é uma das patrocinadoras das ONGs "Viva Rio” e “Sou da Paz”, que atuam no nosso Brasil.

Emblemático, não acham?

Se o desarmamento e o incentivo a “não reação” incentivam o banditismo, complicando a segurança pública, pior ainda é quando se trata da segurança nacional. Aí então é que atrai todas as desgraças.

A Noruega, com seu pacifismo e sua debilidade militar, atraiu simultaneamente a invasão britânica e a alemã na II Guerra Mundial e sua capital foi tomada por uma banda de música, enquanto a Suíça ficou sem ser invadida nas duas grandes guerras.

Por que será?

É porque a Suíça reage e sua população é armada. A Noruega, desarmada e pacifista, ou seja, acovardada, é invadida e ocupada. A Suíça, corajosa e bem armada, conquista o direito de viver em paz.

Está na hora de pensar que tipo de nação queremos ser. Se queremos ser um grupo de pessoas vestidas de branco, choramingando para conscientizar os malfeitores; se queremos nossos filhos amedrontados, encerrados em casa. Ou se queremos pisar firme, cantar alto e sorrir livres.

domingo, 3 de julho de 2011

Estamos com fome de amor (Arnaldo Jabor)


Uma vez Renato Russo disse com uma sabedoria ímpar: "Digam o que disserem, o mal do século é a solidão". Pretensiosamente digo que assino embaixo sem dúvida alguma. Parem pra notar, os sinais estão batendo em nossa cara todos os dias.

Baladas recheadas de garotas lindas, com roupas cada vez mais micros e transparentes, danças e poses em closes ginecológicos, chegam sozinhas. E saem sozinhas. Empresários, advogados, engenheiros que estudaram, trabalharam, alcançaram sucesso profissional e, sozinhos.

Tem mulher contratando homem para dançar com elas em bailes, os novíssimos "personal dance", incrível. E não é só sexo não, se fosse, era resolvido fácil, alguém duvida?

Estamos é com carência de passear de mãos dadas, dar e receber carinho sem necessariamente ter que depois mostrar performances dignas de um atleta olímpico, fazer um jantar pra quem você gosta e depois saber que vão "apenas" dormir abraçados, sabe, essas coisas simples que perdemos nessa marcha de uma evolução cega.

Pode fazer tudo, desde que não interrompa a carreira, a produção. Tornamos-nos máquinas e agora estamos desesperados por não saber como voltar a "sentir", só isso, algo tão simples que a cada dia fica tão distante de nós.

Quem duvida do que estou dizendo, dá uma olhada no site de relacionamentos Orkut, o número que comunidades como: "Quero um amor pra vida toda!", "Eu sou pra casar!" até a desesperançada "Nasci pra ser sozinho!".

Unindo milhares, ou melhor, milhões de solitários em meio a uma multidão de rostos cada vez mais estranhos, plásticos, quase etéreos e inacessíveis.

Vivemos cada vez mais tempo, retardamos o envelhecimento e estamos a cada dia mais belos e mais sozinhos. Sei que estou parecendo o solteirão infeliz, mas pelo contrário, pra chegar a escrever essas bobagens (mais que verdadeiras) é preciso encarar os fantasmas de frente e aceitar essa verdade de cara limpa. Todo mundo quer ter alguém ao seu lado, mas hoje em dia é feio, démodé, brega.

Alô gente! Felicidade, amor, todas essas emoções nos fazem parecer ridículos, abobalhados, e daí? Seja ridículo, não seja frustrado, "pague mico", saia gritando e falando bobagens, você vai descobrir mais cedo ou mais tarde que o tempo pra ser feliz é curto, e cada instante que vai embora não volta.

Mais (estou muito brega!), aquela pessoa que passou hoje por você na rua, talvez nunca mais volte a vê-la, quem sabe ali estivesse a oportunidade de um sorriso a dois.

Quem disse que ser adulto é ser ranzinza? Um ditado tibetano diz que se um problema é grande demais, não pense nele e se ele é pequeno demais, pra quê pensar nele. Dá pra ser um homem de negócios e tomar iogurte com o dedo ou uma advogada de sucesso que adora rir de si mesma por ser estabanada; o que realmente não dá é continuarmos achando que viver é out, que o vento não pode desmanchar o nosso cabelo ou que eu não posso me aventurar a dizer pra alguém: "vamos ter bons e maus momentos e uma hora ou outra, um dos dois ou quem sabe os dois, vão querer pular fora, mas se eu não pedir que fique comigo, tenho certeza de que vou me arrepender pelo resto da vida".

Antes idiota que infeliz!

domingo, 26 de junho de 2011

Felicidade (Paulo Pereira da Costa)

Dos bens que o ser humano almeja, acho que a felicidade deveria vir em primeiro lugar. Se o gênio da lâmpada surgisse para atender a um pedido, muitos desejaríamos ser podres de ricos, outros, muito bonitos, outros, muito inteligentes, enfim... Talvez poucos dissessem apenas: “quero ser feliz”. Na verdade, as pessoas buscam a felicidade, e os desejos que mencionei são o caminho que a maioria pensa que leva a ela. Sonha-se em ganhar muito dinheiro, ter poder, beleza, influência, etc., porque se supõe que sem isso não dá pra ser feliz. Ou seja, para muitos, a felicidade é um tesouro inatingível antes da conquista de um monte de outras coisas. Mas o que, afinal, é ser feliz? Ter uma bela casa? Carro top de linha? Roupas caras? Muito dinheiro? Não. A felicidade é um estado de espírito, um sentimento que se sustenta sem necessidade de certos valores materiais.

Está mais no que se é do que naquilo que se tem. De que vale uma cama confortável se o sono não vem?

A felicidade existe. Não é possível, obviamente, tê-la o tempo todo porque, afinal, não somos invulneráveis. Mas está presente na nossa vida muito mais do que imaginamos. Às vezes ela está ali, pronta para ser usufruída, mas não a reconhecemos; então vamos procurá-la nas coisas e nos lugares errados, e aí caímos na solidão, na frustração, na insatisfação.

Há uma preocupação excessiva de passar uma boa impressão, de mostrar prosperidade, de ostentação, uma vontade insana de querer parecer melhor do que os outros. Isso nada tem a ver com felicidade. Canta Moraes Moreira: “Felicidade é uma casinha pequenina/ é uma cidade, é uma colina/ qualquer lugar que se ilumina/ quando a gente quer amar...” (Pão e Poesia). A felicidade é uma luz que sai de dentro da gente e reflete ao redor, não importa o tempo nem o lugar. Certa vez, depois do trabalho, fui buscar minha filha caçula na escola; quando voltava, ao parar no semáforo, olhei para trás e vi-a deslumbrada, prestando atenção nas lojas, nas luzes, no movimento das pessoas. Percebi que, a despeito da lentidão do trânsito, do cansaço, aquele era um momento feliz. A felicidade dela me contagiou.

A nossa mania de grandeza impede-nos de ver e sentir que, na maior parte do tempo, somos felizes. Não há necessidade de que tudo esteja perfeito. Não carece de êxtase supremo, grande exaltação, frenesi, prazer extremo. A dádiva da vida já é motivo de júbilo. Há muitas coisas simples que são prazerosas. A mera satisfação de nossas necessidades biológicas, por exemplo. Aquele cochilo no sofá com o livro caído do lado, o desenho animado do Snoopy, ler, ver a chuva cair, ter comida na mesa, caminhar, conversar com gente bacana, matar a sede com um caldo de cana. Para ser feliz, basta valorizar coisas e situações simples, muitas delas gratuitas, que propiciam satisfação íntima, bem-estar.

O trabalho pode ser prazeroso se visto como algo que propicia estar com os amigos, ajudar pessoas, exercitar a criatividade, superar-se. Ser feliz é viver. Viver é enfrentar problemas, buscar serenidade, força espiritual, romper barreiras, lutar. Vida é energia, é ação, é o beijo, o abraço, o aperto de mão. É o sorriso, é ser criança, é ser livre, ter esperança.

É sonhar, é compartilhar. É satisfazer a vontade, é aproveitar a ocasião, a oportunidade. É tentar a conquista, é ter um ponto de vista.

Felicidade é gostar de viver sabendo dos altos e baixos, dos solavancos; é ter disposição para subir e descer barranco, empurrar o carro para pegar no tranco; é não ligar se tem muito ou pouco dinheiro no banco; felicidade é viver com intensidade, sem se importar com a idade nem se é pobre ou rico; é ter liberdade, autenticidade, não ter medo de ‘pagar mico’, prezar pela verdade, não dar bola para fuxico; felicidade é apreciar a arte, é conviver, ter amizade, é fazer parte; é aprazer-se com coisas simples, gostar do trivial, cultivar a bondade, fazer o outro sentir-se especial, perdoar, vencer dificuldade; felicidade é o fascínio com o brilho da lua, é o domínio da vontade fútil, é comer cenoura crua, é sentir-se útil; é ter bom humor, é apreciar o sabor da comida, é a turma reunida; felicidade é viver cada segundo em plenitude, é não desejar o impossível, é saber envelhecer, ter noção da magnitude de cada ato, é ser sensato; felicidade é encontrar amigos, relembrar fatos antigos, prosear; é ter alegria, sorrir, buscar harmonia, é amar, é dar graças a Deus por existir.

Muitas coisas me deixam feliz, mas uma, em especial, é saber que você leu este texto até o final.