domingo, 29 de março de 2020

A eterna culpa da mídia e a inocência dos políticos (Bruno Momesso Bertolo)


Quando mais jovem, tinha prazer em redigir artigos para os jornais do município, um site de jornalistas e meu blog. Havia debates produtivos, respeito na discussão e, pasme, argumentos. Atualmente há ofensas e “haters”. E o pior: memes! Uma figura com poucas palavras “vence” diversas linhas e, às vezes, até horas de redação. Com direito a óculos de “Thug life”, se bobear. Diante de sobredito panorama, é difícil ter ânimo para escrever.

Entretanto, familiares e amigos me pediram para retornar aos textos. É por vocês que estou aqui! E será salutar para mim também, é claro! Esta última noite insone, uma característica daquela época (um misto de ideias que surgem e não permitem dormir, bem como a ansiedade em escrever), deve ser um indicador positivo também.

Eis um tema (tão em voga) que há meses pretendia abordar em muitos parágrafos: a mídia! Como serão vários pontos, dividirei em capítulos para ninguém se perder. Nem eu!

Capítulo 1: A contradição

Lula, a “alma viva mais honesta desse país”, em seus discursos dizia que a imprensa seria um braço do capital especulativo, da direita e da elite, perseguindo-o porquê ele fazia um governo para os pobres.

Dilma, a fantoche, até hoje se vitimiza alegando que foi alvo de um golpe orquestrado pela mídia.

Bolsonaro, o novo Galileu Galilei (ele está certo, o mundo está errado), sustenta que a mídia é de esquerda, distorce os seus pronunciamentos (cada pérola que nos faz pensar se Dilma voltou!) e quer criar pânico (especialmente em uma época de, oras pois, pandemia mundial!) para derrubá-lo.

Conclusão óbvia: ou uma, ou outra tese. Uma anula a outra e não podem coexistir. Quem tem razão? O lulo-petismo ou o olavo-bolsonarismo?

Minha opinião: nenhum dos dois. A meu ver, a imprensa brasileira cumpre seu papel ao investigar e criticar os poderosos e, por conseguinte, sofre ataques de quem não sabe ou não pode se defender. Algo semelhante acontece com o Ministério Público, outro órgão que, na ótica dos políticos, os acossa gratuitamente. Coitados de nossos inocentes políticos, os mais honestos e patriotas do planeta!

Capítulo 2: Deixe de ser ingrato, bolsominion!

Quando toda a imprensa brasileira e mundial noticiaram os escândalos de corrupção envolvendo o PT, mormente o Mensalão e o Petrolão, além do destaque do processo de impeachment de Dilma, os críticos do PT (na época não existia o bolsonarismo) eram apenas elogios. A mídia era perfeita. O que mudou senão o governo?

Aliás, conforme relato dos próprios integrantes da Operação Lava-Jato, ela atingiu proporções e resultados gigantescos graças à ampla divulgação e apoio da imprensa.

Em outras palavras: deixe de ser ingrato, bolsominion! Todo cidadão deveria agradecer por ter uma imprensa livre.

E agora, a outrora mídia elitista e golpista, na visão dos fanáticos petistas, está fazendo um excelente trabalho.

Entenderam? Sempre foi assim! Na oposição uma postura; uma vez no poder, outra. E a culpa é da mídia...

Capitulo 3: Profissionalismo é necessário em toda profissão

Puxa vida, que bela constatação! Redescobriu a roda! Profissionalismo é necessário em toda profissão. Óbvio ululante (nada a ver com o Lula, por favor!)! Pois é! Todavia, nesses tempos de pós-verdade (a opinião existe por si mesma, independe de provas e fundamentos, isto é, “creio e acabou”), até mesmo o que é inequívoco precisa ser lembrado e dito.

Você realizaria uma operação com um médico que apenas atende em redes sociais? Pegaria um avião cujo piloto se credenciou pelo WhatsApp? Suponho que não!

Apesar da decisão do STF dispensando o requisito do diploma para exercer o Jornalismo, o fato é que um bom repórter depende de conhecimento e uma estrutura para desempenhar razoavelmente seu ofício. Além disso, em regra atuam por empresas, de modo que poderão ser responsabilizados civil e/ou criminalmente em caso de uso indevido na divulgação das notícias.

Isso se chama profissionalismo e é uma forma de controle estatal. Nas redes sociais, reduto propício para anônimos, como você identifica a fonte da informação? Qual a credibilidade? Como punir nos excessos?

Esses dias de quarentena propiciaram um passeio pelos denominados “influenciadores digitais”. Evidentemente conhecia os mais famosos, porém são inúmeros personagens, no mínimo, inusitados. Utilização de megafone, tapas e socos na mesa, palavrões, enfim, uma gama de bizarrices. E são os atuais formadores de opinião. Muitos dos quais visam tão-somente um cargo nas próximas eleições. No último pleito, vários conseguiram aludido intento.

Para ilustrar: terraplanismo, antivacinação e outros absurdos medievais jamais seriam publicados na mídia tradicional. Sequer passariam na triagem.

Capítulo 4: Maus profissionais existem em todo lugar

Indubitavelmente, há maus jornalistas e empresas duvidosas e/ou tendenciosas. Maus profissionais existem em todo lugar. E toda generalização é injusta e burra. Virou rotina se deparar no Facebook com postagem como “Jornalismo não serve para nada”, “Tudo comprado”, “Pelo fim do jornalismo” e afins.

A quem interessa uma imprensa fragilizada?

A função dos veículos de comunicação sempre foi e é essa mesmo: questionar, criticar, informar. Quer uma mídia que elogie o governo? Vou sugerir duas: Pravda (“Verdade” em russo”) e Granma. Aquele, da antiga União Soviética; este, jornal cubano. Resumindo: você é um comunista enrustido!

Alegar que toda a imprensa é de esquerda é ridículo! Como era patético o PT sustentar que era toda de direita! A pluralidade de ideologias existe e varia conforme o proprietário, o editor-chefe e interesses. Não sei se percebeu, mas eles também são humanos. Basta você discernir o que é de qualidade ou não, contudo, sem julgamentos formados ou antecipados. E sem jogar todos na vala comum de que nada presta.

Capítulo 5: Uma citação de jornalista, outra de político

“Dizem que ofendo as pessoas. É um erro. Trato as pessoas como adultas. Critico-as. É tão incomum isso na nossa imprensa que as pessoas acham que é ofensa. Crítica não é raiva. É crítica. Às vezes é estúpida. O leitor que julgue. Acho que quem ofende os outros é o jornalismo em cima do muro, que não quer contestar coisa alguma. Meu tom às vezes é sarcástico. Pode ser desagradável. Mas é, insisto, uma forma de respeito, ou, até, se quiserem, a irritação do amante rejeitado.” (Paulo Francis)

"Existe uma terrível desvantagem de não ter a qualidade abrasiva da imprensa aplicada a nós todos os dias. Mesmo que não gostemos, e mesmo que desejássemos que não tivessem escrito, e mesmo que não aprovemos, não existe nenhuma dúvida que não faríamos o nosso trabalho numa sociedade livre sem uma imprensa ativa, muito ativa.” (John F. Kennedy)