O projeto de lei que autoriza o
Município de Limeira a cobrar dívidas por meio de cartórios de protesto causa
polêmica desde que foi anunciado. Pode ou não pode? É constitucional ou não? Se
pairavam dúvidas sobre a constitucionalidade de referida iniciativa
legislativa, não restam mais, sobretudo diante da notícia de que a regra
destinar-se-á apenas para os pequenos devedores. Trata-se, indubitavelmente, de
projeto normativo inconstitucional.
Como é notório e consoante
determinação constitucional, todos são iguais perante a lei, de modo que uma
norma somente poderá conceder tratamentos diferenciados se houver um fator de
discrímen que o legitime, vale dizer, uma conjuntura que justifique a
diferenciação e o rompimento da igualdade. No caso em apreço, não há quaisquer
circunstâncias que autorizem a cobrança cartorária exclusivamente contra os
devedores de quantias menores, evidenciando, assim, que tal projeto de lei é
elitista e preconceituoso, além de repugnante. Neste ponto, impossível não
lembrar a célebre frase de George Orwell na obra "A revolução dos
bichos": "Todos são iguais, mas alguns são mais iguais que
outros".
Afinal, punir-se-á o cidadão de
escassas posses que muitas vezes atrasa o pagamento dos – estimados e elevados
– tributos em decorrência de ter que escolher entre suprir suas necessidades
básicas ou engordar os cofres públicos. De outro lado, aquele que reside em
luxuosos condomínios e faraônicas mansões está incólume em ter seu nome lançado
no SCPC, embora não quite seus impostos por pura desfaçatez. Muito justo, não?
Seria a honra do rico mais importante que a do pobre?
Supramencionado esboço normativo
parece ter o escopo de contribuir com nossa legislação pátria, que é
extremamente eficaz para penalizar os menos favorecidos, enquanto é ineficiente
para sancionar os mais abastados. Se não é verdade, então por qual motivo ainda
não foi promulgada lei que regulamenta o imposto sobre grandes fortunas,
estabelecido na Constituição Federal em 1.988? Seriam necessários 25 anos para
elaborar citado diploma legal? Ou é mera falta de vontade política, haja vista
que prejudicaria interesses de pessoas influentes e parlamentares?
Noutras palavras: ou a lei se aplica a
todos ou então não se aplica. Em todo o mundo (em alguns países mais, em outros
menos) vive-se – indiretamente e por diversos fatores – em uma plutocracia,
isto é, o governo dos ricos. Não precisamos de leis que reforcem este estado
oligárquico que atenta contra a democracia. Portanto, para evitar a pecha de
inconstitucionalidade, deverá ser cobrada a dívida de todos os contribuintes,
conforme afirmou (sem convencer, especialmente porque desdisse o que havia
dito) o Secretário de Assuntos Jurídicos em razão da repercussão negativa do
discurso do dia anterior. Caso contrário, nefasto rascunho de lei (se é que
assim pode ser denominado) deverá ser encaminhado não para protesto, mas para a
lixeira.