domingo, 2 de agosto de 2009

Mulheres vítimas de violência estão mais conscientes de seus direitos (Rodrigo Augusto Prando)

O aumento de 125% nas denúncias de casos de estupro registrados pelo Disque Denúncia do Rio de Janeiro nos leva a uma reflexão em duas principais dimensões.

Em primeiro lugar, o estupro e outras violências contra as mulheres têm, infelizmente, ainda hoje, forte ligação com nossa formação social. A sociedade brasileira assentou-se numa dinâmica que priorizou por muito tempo a família patriarcal e, no bojo desta, o poder do homem. Um indicativo pode ser visualizado no mundo jurídico. Não faz muito, era frequente a tese de que um homem pudesse matar a esposa em “legítima defesa de sua honra”.

As agressões relacionadas ao gênero carregam muito de conteúdo social, de aceitação do machismo por parte da sociedade, seja em pequenos chistes ou em casos mais grosseiros e graves. O pior, nessa ótica equivocada, é transferir à mulher a culpa pela situação.

A outra dimensão que nos leva a refletir diz respeito aos números apresentados pelo Disque Denúncia. Não se pode afirmar peremptoriamente que haja relação direta entre o número de denúncias e o aumento global dos casos de estupro. Isso demandaria uma pesquisa de mais fôlego. Há algo de positivo nesses números: as mulheres vítimas de violência (estupros ou outras formas de agressão) estão mais conscientes de seus direitos e perdem paulatinamente o medo de denunciar seus agressores.

É sabido que muitas vezes estes se encontram na família ou são próximos das vítimas. A falta de denúncia das agressões sofridas pode ser compreendida, por um lado, pela tentativa de não tornar a sociabilidade da família ou do grupo de convivência disfuncional; por outro lado, uma constante sensação de impunidade reinante desestimularia a denúncia.

De todo modo, se esses números de denúncias indicarem o aumento de consciência de direitos e deveres, por parte não só das mulheres, mas de toda a sociedade, vale a pena ressaltar a mudança como um fato positivo. O Brasil vem, cada vez mais, consolidando (com alguns retrocessos, é verdade) sua democracia.

Trazer a democracia à tona é ultrapassar a visão do senso comum de que seria suficiente votar, escolher os representantes no Executivo e Legislativo. Na verdade, a democracia deve ser exercida nas esferas mais íntimas da vida: na educação dos filhos, no diálogo entre as diferenças e na vida sexual.