domingo, 27 de janeiro de 2013

O êxito das cotas raciais (Bruno Momesso Bertolo)


Ao planejar o presente artigo, cogitei em explicar a razão e necessidade das cotas raciais, apresentando inúmeras informações de órgãos de credibilidade que demonstram, sem dúvidas e de forma cristalina, o abismo social existente entre negros e brancos no Brasil. Contudo, considerando que referido aspecto já foi discutido à exaustão e diante do entendimento do STF acerca de sua constitucionalidade, creio ser algo ultrapassado, a despeito dos protestos que ainda despertam. Limitar-me-ei, portanto, ao sucesso das ações afirmativas.

Neste ponto, é necessário colacionar diversos dados estatísticos (da PED, Pesquisa de Emprego e Desemprego, realizada em conjunto com a Fundação SEADE e DIEESE) que evidenciam, indubitavelmente, o êxito das políticas públicas de ações afirmativas:

1) Entre 1997 e 2011, quintuplicou a percentagem de negros e pardos que cursam ou concluíram o ensino superior, passando de 4% para 19,8%, representando 12,8 milhões de jovens de 18 a 24 anos.

2) A renda média dos trabalhadores negros nos 39 municípios da região metropolitana de São Paulo cresceu cinco vezes mais do que a dos não negros (brancos e amarelos) de 2002 a 2011, com aumentos de 14,8% e 2,9%, respectivamente. Todavia, na média, os afrodescendentes ainda recebem salários inferiores, correspondentes a 61% dos caucasianos e orientais.

3) Em 2002, 23,6% da População Econômica Ativa (PEA) negra se encontravam desempregados, enquanto a taxa dos não negros era de 16,4%, uma diferença de 7,2 pontos percentuais. Por outro lado, em 2011, o índice dos negros à espera de vagas era de 12,2% e dos não negros 9,6%, de modo que a disparidade entre raças diminuiu para 2,6 pontos percentuais.

Trata-se de pura lógica: com o maior acesso ao ensino superior, os afrodescendentes obtiveram melhor qualificação, o que facilita, por conseguinte, a conquista de cargos de maior remuneração. E menos desemprego. Uma equação simples, porém eficaz. Nem se argumente que são meras coincidências ou fruto do crescimento econômico. De forma alguma.

Resta patente que são resultados inerentes das políticas adotadas, comprovando o êxito das cotas raciais. As quais propiciam, além de equidade, a possibilidade de classes e raças diferentes se relacionarem e conviverem, situação que não ocorria em razão da marginalização histórica e social. O racismo e o preconceito não desaparecerão ao serem ignorados, mas enfrentados, como ocorreu em diversas nações.

Entretanto, apesar de supramencionados avanços sociais, há muito a ser reparado. Nesse sentido, basta relatar que:

1) Em 2011, no setor de serviços (aproximadamente metade da geração de postos de trabalho na região metropolitana de São Paulo) 48,8% do total de ocupados eram negros e 54,6% não negros; na indústria, 17,2 e 18,4%; no comércio, 16,2% e 15%, respectivamente.

2) Aludidas taxas invertem quando se referem a atividades cuja exigência de formação acadêmica é menor, as remunerações são mais baixas e as condições mais precárias, como na construção civil, setor no qual 8,4% são negros e 4,9% não negros. Idêntica conjuntura se dá nos empregos domésticos, com percentuais de 10,1% e 5,4%.

3) Os cargos no setor público ainda são ocupados, em sua maioria, por brancos e amarelos: 8,6% ante 6,4% dos negros. Com relação a segmentos econômicos mais restritos, como o de empregadores e profissionais liberais, as desigualdades são ainda maiores, com 9,3% diante de 3,8%.

Por evidente, tendo em vista que os afrodescendentes (negros e pardos) representam 50% da população brasileira, o ideal é que tenhamos uma igualdade em todos os setores e dados sociais. Quando assim for, as cotas raciais poderão e deverão ser abolidas, pois terão cumprido sua função. E todos serão premiados com isso, afinal, brancos e negros viverão em uma sociedade mais justa e fraterna.

domingo, 13 de janeiro de 2013

Somos apenas números (Bruno Momesso Bertolo)


Inicialmente, um alerta: o presente artigo é deveras pessimista e poderá – embora não seja este o intuito – provocar desalento. Afinal, dissertarei sobre o nefasto tratamento que o Estado brasileiro destina a seus cidadãos, nada obstante as arrecadações tributárias (especialmente impostos) aumentarem a cada ano.

Ao que tudo indica, na concepção de nossos governantes, somos apenas números. Se morrermos baleados em um assalto ou à míngua em razão do precário sistema de saúde público, azar nosso, que entraremos para as estatísticas. Quem quiser ser tratado com dignidade precisa contratar serviços particulares para tanto. Os únicos algarismos sobre nós que possuem relevância aos políticos são os atrelados ao quanto contribuímos com os tributos e em quem votaremos. No mais, pouco se importam conosco.

Com efeito, nos diversos meios de comunicação é propagado que a Receita Federal detém um dos melhores sistemas de fiscalização do mundo, o que evidencia a sanha puramente arrecadatória da Administração Pública. Logo, quando quer e interessa, os mandatários do povo investem maciçamente em tecnologias desenvolvidas, ao menos no que concerne a amealhar recursos financeiros. No Estado de São Paulo, por exemplo, conquanto tenha ocorrido a privatização das rodovias, ainda permanece a cobrança de IPVA (um dos mais elevados do país), havendo até radares nas vias para flagrar contribuintes em débito. Eis as prioridades dos nossos comandantes políticos...

De outro lado, os dados atinentes à violência no Brasil atingem patamares cada vez piores. A título ilustrativo, basta mencionar que somos os recordistas mundiais em homicídios, com mais de 52.000 mortes anuais. Se não bastasse, a taxa de elucidação de tais crimes é de aproximadamente 8%, ao passo que nos EUA é de 65%, na França 80% e no Reino Unido 90%. Em Limeira há um caso emblemático: uma execução ocorrida no Centro da cidade e às 16 horas, ainda impune. O que podemos esperar diante de referido quadro? Se o índice de esclarecimento dos delitos cometidos contra a vida (bem supremo) sequer alcançam 10%, quais seriam os percentuais nos demais crimes? Estamos ou não estamos desamparados? Onde estão investimentos em tecnologias de ponta para inibir e desvendar os crimes perpetrados contra a população? E nem comentarei sobre a saúde, educação e outros setores.

Portanto, constata-se que os entes públicos brasileiros priorizam a arrecadação e desprezam a consecução do bem comum. Na verdade, parece que nossa função precípua é pagar impostos, visando sustentar uma pequena casta social e seus obscenos privilégios. Neste ponto, urge lembrar que a Inconfidência Mineira foi deflagrada porque a sociedade se revoltou contra o imposto de 1/5 (que deu origem à expressão "quinto dos infernos") sobre a extração do ouro. Atualmente, a carga tributária tupiniquim é de 38%, ou seja, quase 2/5. Até quando aceitaremos?

Precisamos ter consciência que significamos outro número: o de milhões de pessoas que podem e devem, quando for necessário, destituir do poder os representantes que demonstrem negligência, desvios de finalidade e improbidade na gestão do erário. Devemos cobrar e fiscalizar, diaria e incisivamente, nossos governantes. Somente assim seremos respeitados como cidadãos possuidores de direitos. E não como meros contribuintes e eleitores.