domingo, 24 de junho de 2007

A dependência emocional (Ángela Sannuti)

Há dias em que vibramos e gozamos do encontro com as pessoas que nos rodeiam, mas há outros em que nos isolamos e vivemos assustados com o deserto que nos circunda e a incomunicação que nos afasta cada vez mais. Há dias em que nos sentimos felizes de criar em profunda solidão, e dias em que a alma e o coração se estremecem na mais fria desolação. Se reparamos ou não, a experiência humana, a experiência de cada um de nós, manifesta-se através destas contradições e paradoxos.

Talvez, uma das situações mais paradoxais de nossa existência possa ser sintetizada nesta singela pergunta: há alguém sobre esta terra que não queira ser livre? E por que a imensa maioria das pessoas, apesar desse anseio de liberdade, vive presa em diferentes tipos de prisão?

Grande parte dos problemas psicológicos e a infelicidade que estes acarretam constituem a expressão visível e manifesta de como se vive encarcerado emocionalmente. Muitos, nem sequer advertem que essas prisões costumam ser de fabricação própria e que o medo os impede de encontrar a chave para sair.

Viver é estar relacionado, a vida é relacionamento constante: vivemos nos outros e os outros também nos habitam.

As pessoas procuram na psicologia a resposta para estes grandes problemas da humanidade: os conflitos nos relacionamentos, a solidão, a liberdade, o amor. E que recebem como resposta?

O século XX foi marcado por grandes teorias e visões parciais que tentaram explicar fragmentos da alma humana. Não haverá algo mais que fragmentos e contradições em nosso ser?

A psicologia colaborou de maneira valiosa, ao abrir nossos olhos para a problemática especificamente humana, mas no meio de tantas teorias e escolas perdemos a visão essencial do que significa ser humano. Assim como através das gretas de um muro pode-se vislumbrar a luz que há por detrás; nós também, através de nossas próprias gretas, podemos aprender a descobrir e assumir nossa integridade e liberdade.

A cultura da dependência

A educação que recebemos e que as novas gerações continuam recebendo se baseia no conformismo, quase tudo o que se aprende se aceita verticalmente. É uma educação coletivizada que não promove o desenvolvimento da capacidade perceptiva, reflexiva, de pesquisa, sensitiva; fomenta-se a mera acumulação de conhecimentos afastados da realidade e de uma visão humana da vida.

Incentiva-se o ajustamento, a imitação de modelos externos e alheios, gerando uma concorrência baseada na comparação constante e nociva, em lugar de largar a natureza essencial de cada um e desenvolver o próprio potencial criativo.

Esta atitude de não questionamento do estabelecido, de aferrar-se a dogmas, crenças rígidas e estáveis, de depender sempre de algo ou de alguém, costuma ser a atitude que cada pessoa mantém, depois, ao longo de sua vida.

Uma sociedade baseada no conformismo e na padronização de condutas e pensamentos - basta observar esta tendência exacerbada na mídia; talvez como uma forma de controle-não pode produzir outro resultado que apatia, passividade, carência de paixão, esvaziamento emocional e espiritual.

Em nossa cultura as condutas imitativas predominam em vez das criativas; preferimos viver com verdades emprestadas em lugar de indagarmos na sabedoria que guardamos em nosso próprio interior.

Como seria uma nova educação? Que aconteceria se a família e o sistema educativo ajudassem a desenvolver e ampliar a consciência de um menino em vez de domesticá-la e anestesiá-la?

Desenvolver a flexibilidade da mente e o coração, a necessidade de se compreender e de compreender os outros, nutrir a solidez interior, respeitar a diversidade da vida em todas suas manifestações, entender os medos e os condicionamentos que embaçam nossa liberdade e autonomia, constituem o núcleo de um crescimento íntegro e não tão fragmentado.

Crescer é acordar para a vida e tornar-se uma pessoa autônoma. Viver despertos é a condição necessária para poder transformar uma educação e uma cultura que costumam marchar, muitas vezes, no sentido contrário do que é a saúde.

Colapsos de auto-estima

Uma autoconsciência sólida, saudável e estável se arraiga na autenticidade de nossos anseios, sentimentos e vivências; um forte sentido de identidade só pode apoiar-se no desenvolvimento emocional próprio. Descobrir, viver e assumir conscientemente nossa verdade pessoal –nossa identidade– é tão imprescindível que pagamos sua perda com penosas doenças e sofrimentos.

Como quase todos nós fomos educados em um modelo da dependência, ocasionalmente somos conscientes da armação na qual vivemos e de como continuamos recriando-a, de geração em geração, com exata precisão.

A dependência só gera medo e insegurança emocional, mergulhando o indivíduo numa luta permanente e extenuante por conseguir a aprovação dos demais; a fonte do sucesso sempre é externa e se termina confundindo admiração com amor.

No fundo, muitos adultos mesmo de idade avançada ou com grandes conquistas sociais, econômicas e intelectuais continuam sendo crianças e dependentes. Uma atitude infantil e submissa subjaz em inúmeras pessoas bem adaptadas à sociedade, de tal maneira só podem mostrar o que se espera e se deseja delas, omitindo ou menosprezando aspectos essenciais de seu ser. Também há outros que vivem sob a pressão de ter que demonstrar sua eficiência e o brilhantismo com que realizam tudo, dominados por um ânsia cega de reconhecimento e fama.

Colapsos de auto-estima estão à espreita destas pessoas e destacam a debilidade dos alicerces de um edifício feito de auto-enganos e ilusões. Estes colapsos são os que surgem nos diversos transtornos depressivos que tanto caracterizam a nossa sociedade atual.

Quanto mais debilitado estiver esse núcleo central da personalidade, mais frágil será a auto-estima e maior a necessidade de se apoiar em figuras, símbolos, gurus, grupos ou causas meramente externas.

Vínculos que atam

Nosso mundo está cheio de pessoas feridas em sua integridade, porque cresceram num contexto emocional cheio de descortesia, hipocrisia, severidade sem limites, desvalorização e desprezo.

Nenhum ser humano precisa alimentar-se de plantas venenosas, mas alguns fazem isso porque não conhecem outra coisa ou porque já se acostumaram, repetindo cegamente profundas impressões de desamor em seus comportamentos e em sua maneira de vincular-se como adultos.

O desamor – em qualquer uma de suas manifestações– está feito de ataduras e dependências; a desconfiança, os ciúmes e o afã de possuir e dominar constituem o alfabeto emocional desses vínculos que atam e que, como toda prisão, bloqueiam o crescimento e desenvolvimento pessoal.

Por que a maioria das pessoas resiste a uma verdadeira mudança e prefere a falsa segurança de uma relação, por mais infeliz ou difícil que seja, à busca de um espaço novo de satisfação e liberdade?

Há vínculos que parecem estar ancorados no tempo: tanto pais como filhos, irmãos e muitos casais vivem presos numa dependência infantil, ingênua e irresponsável, negando e mantendo sob controle inseguranças e medos muito profundos.

Toda relação que limita as ações, os sentimentos e pensamentos próprios termina sendo mera dependência, da qual surge invariavelmente um processo de auto-encerro e isolamento. A dependência é a negação da verdadeira relação.

Todos podem mudar sua vida e amadurecer. A maturidade psicológica outorga a confiança e a segurança necessárias para arriscar-se a tomar o destino nas próprias mãos e descobrir a possibilidade de amar por livre escolha.

O que é o amor?

Todos nós, em alguma medida, desejamos ser amados e também dar amor; mas geralmente o que parece ser amor com freqüência não é.

Em nossa cultura, um dos tantos conceitos falsos que os séculos nos incrustaram é a idéia de que dependência é amor.

Mas dependência não é amor, o afã de possuir e dominar não é amor, o medo não é amor. Amor implica vulnerabilidade – estar abertos em nossa sensibilidade– e implica comunhão. Como pode haver comunhão com outro quando há medo e desconfiança?

A maioria das pessoas querem, antes de mais nada, a segurança de amar e serem amados. A exigência de se sentirem seguros se torna mais importante do que o amor em si, isto mesmo constitui a raiz psicológica da dependência emocional.

As pessoas dependentes estão unicamente interessadas em seu próprio bem-estar; desejam preencher seu vazio interior à custa de outros, renunciaram a qualquer esforço por se transformarem e melhorarem como seres humanos; não tolerando também o risco e a solidão que implica crescer.

Quando se ama tem que haver liberdade, não só em relação a outra pessoa mas também em relação a si mesmo.

É necessário ver e enfrentar a carência de liberdade, os medos, as inseguranças, a desvalorização e todas as formas de dependência que adotamos em nossos vínculos.

Fomentar a autonomia dos demais é a manifestação mais decisiva do amor; mas só se nós mesmos formos seres autônomos é que poderemos travar vínculos plenamente desenvolvidos.

O amor é um estado do ser e, assim como a chuva elimina o pó das folhas das plantas, nós crescemos e evolucionamos através do rio da vida, conforme vamos nos despojando de tudo aquilo que não for verdadeiro amor.

Nós dizemos não (Eduardo Galeano)

Em julho de 1988, em plena ditadura do general Pinochet, 300 intelectuais e artistas participaram de "Chile Cria", um encontro internacional de arte, ciência e cultura pela democracia no Chile. Este é o discurso de inauguração, que Eduardo Galeano pronunciou em nome de todos os convidados.


"Viemos de diversos países, e estamos aqui, reunidos à sombra generosa de Pablo Neruda: estamos aqui para acompanhar o povo do Chile, que diz não. Nós também dizemos não.


Dizemos não ao elogio do dinheiro e da morte. Dizemos não a um sistema que põe preço nas coisas e nas pessoas, onde quem mais tem é quem mais vale; dizemos não a um mundo que destina dois milhões de dólares por minuto para as armas de guerra enquanto mata, por minuto, 30 crianças, de fome ou doença curável. A bomba de nêutrons, que salva as coisas e aniquila as pessoas, é um perfeito símbolo de nosso tempo. Para o sistema assassino que converte em objetivos militares as estrelas da noite, o ser humano não é nada mais do que um fator de produção e consumo e objeto de uso; o tempo não é outra coisa que um recurso econômico; e o planeta inteiro, uma fonte de renda que deve render até a última gota de seu caldo. A pobreza é multiplicada para que a riqueza possa se multiplicar, e multiplicam-se as armas que garantem essa riqueza, riqueza de pouquinhos, e que mantém à margem a pobreza de todos os outros, e também se multiplica, enquanto isso, a solidão: nós dizemos não a um sistema que nega comida e nega amor, que condena muitos à fome de comida e muitos mais à fome de abraços.


Dizemos não à mentira. A cultura dominante, que os grandes meios de comunicação irradiam em escala universal, nos convida a confundir o mundo com um supermercado ou uma pista de corrida, onde o próximo pode ser uma mercadoria ou um competidor, mas jamais um irmão. Essa cultura mentirosa, que grotescamente especula com o amor humano para arrancar-lhe mais-valia, é na realidade a cultura do desvínculo: tem por deuses os ganhadores, os exitosos donos do dinheiro e do poder, e por heróis os "Rambos" fardados que cuidam de suas costas aplicando a Doutrina da Segurança Nacional. Pelo que diz e pelo que cala, a cultura dominante mente que a pobreza dos pobres não é um resultado da riqueza dos ricos, mas que é filha de ninguém, vinda no bojo de uma couve-flor ou da vontade de Deus, que fez os pobres preguiçosos e burros. Da mesma maneira, a humilhação de alguns homens provocada por outros não tem por que motivar a solidária indignação ou o escândalo, porque pertence à ordem natural das coisas: as ditaduras latino-americanas, por exemplo, fazem parte de nossa exuberante natureza e não do sistema imperialista de poder.


O desprezo transforma a história e mutila o mundo. Os poderosos fabricantes de opinião nos tratam como se não existíssemos, ou como se fôssemos sombras bobas. A herança colonial obriga o chamado Terceiro Mundo, habitado por pessoas de terceira categoria, a aceitar como própria a memória de seus vencedores, e obriga-o a compor a mentira alheia para usá-la como se fosse a própria verdade. Premiam a nossa obediência, castigam a nossa inteligência e desalentam a nossa energia criadora. Somos opinados, mas não podemos ser opinadores. Temos direito ao eco, não à voz, e os que mandam elogiam nosso talento de papagaios. Nós dizemos não: nós nos negamos a aceitar esta mediocridade como destino.


Nós dizemos não ao medo. Não ao medo de dizer, ao medo de fazer, ao medo de ser. O colonialismo visível proíbe dizer, proíbe fazer, proíbe ser. O colonialismo invisível, mais eficaz, nos convence de que não se pode dizer, não se pode fazer, não se pode ser. O medo se disfarça em realismo: para que a realidade não seja irreal, dizem os ideólogos da impotência, a moral haverá de ser imoral. Frente à indignidade, frente à miséria, frente à mentira, não temos outro remédio além da resignação. Marcados pela fatalidade, nascemos preguiçosos, irresponsáveis, violentos, bobos, pitorescos e condenados à tutela militar. No máximo, podemos aspirar a converter-nos em prisioneiros de bom comportamento, capazes de pagar pontualmente os interesses de uma descomunal dívida externa contraída para financiar o luxo que nos humilha e o bastão que nos golpeia.


E neste estado de coisas, nós dizemos não à neutralidade da palavra humana. Dizemos não aos que nos convidam a lavar as mãos perante as cotidianas crucificações que ocorrem ao nosso redor. À aborrecida fascinação de uma arte fria, indiferente, contempladora do espelho, preferimos uma arte quente, que celebra a aventura humana no mundo e nela participa, uma arte irremediavelmente apaixonada e briguenta. Seria bela a beleza, se não fosse justa? Seria justa a justiça, se não fosse bela? Nós dizemos não ao divórcio entre a beleza e a justiça, porque dizemos sim ao seu abraço poderoso e fecundo.


Acontece que nós dizemos não, e dizendo não estamos dizendo sim.


Dizendo não às ditaduras, e não às ditaduras disfarçadas de democracias, nós estamos dizendo sim à luta pela democracia verdadeira, que a ninguém negará o pão e a palavra, e que será bela e perigosa como um poema de Neruda ou uma canção de Violeta Parra.


Dizendo não ao devastador império da cobiça, que tem seu centro no norte da América, nós estamos dizendo sim a outra América possível, que nascerá da mais antiga das tradições americanas, a tradição comunitária: a tradição comunitária que os índios do Chile defendem desesperadamente, de derrota em derrota, há cinco séculos.


Dizendo não à paz sem dignidade, nós estamos dizendo sim ao sagrado direito de rebelião contra a injustiça e contra sua longa história, longa como a história da resistência popular no longo mapa do Chile.


Dizendo não à liberdade do dinheiro, nós estamos dizendo sim à liberdade das pessoas: liberdade maltratada e machucada, mil vezes derrubada, como o Chile e, como o Chile, mil vezes erguida.


Dizendo não ao egoísmo suicida dos poderosos, que converteram o mundo em um vasto quartel, nós estamos dizendo sim à solidariedade humana, que nos dá sentido universal e confirma a força de fraternidades mais poderosas que todas as fronteiras com todos os seus guardiões: essa força que nos invade, como a música do Chile, e que como o vinho do Chile nos abraça.


E dizendo não ao triste encanto do desencanto, nós estamos dizendo sim à esperança, à esperança faminta e louca e amante e amada, como o Chile: a esperança obstinada como os filhos do Chile rompendo a noite."

Roubando galinhas (Luis Fernando Veríssimo)

Pegaram o cara em flagrante roubando galinhas de um galinheiro e levaram para a delegacia.


- Que vida mansa, heim, vagabundo? Roubando galinha para ter o que comer sem precisar trabalhar. Vai para a cadeia!
- Não era para mim não. Era para vender.
- Pior. Venda de artigo roubado. Concorrência desleal com o comércio estabelecido. Sem-vergonha!
- Mas eu vendia mais caro.
- Mais caro?
- Espalhei o boato que as galinhas do galinheiro eram bichadas e as minhas não. É que as do galinheiro botavam ovos brancos enquanto as minhas botavam ovos marrons.
- Mas eram as mesmas galinhas, safado!
- Os ovos das minhas eu pintava.
- Que grande pilantra...


Mas já havia um certo respeito no tom do delegado.


- Ainda bem que tu vai preso. Se o dono do galinheiro te pega...
- Já me pegou. Fiz um acerto com ele. Me comprometi a não espalhar mais boato sobre as galinhas dele, e ele se comprometeu a aumentar os preços dos produtos dele para ficarem iguais aos meus. Convidamos outros donos de galinheiro a entrar no nosso esquema. Formamos um oligopólio. Ou, no caso, um ovigopólio.
- E o que você faz com o lucro do seu negócio?
- Especulo com dólar. Invisto alguma coisa no tráfico de drogas. Comprei alguns deputados. Dois ou três ministros. Consegui exclusividade no suprimento de galinhas e ovos para programas de alimentação do governo e superfaturo os preços.


O delegado mandou pedir um cafezinho para o preso e perguntou se a cadeira estava confortável, se ele não queria uma almofada. Depois perguntou:


- Doutor, não me leve a mal, mas com tudo isso, o senhor não está milionário?
- Trilionário. Sem contar o que eu sonego de Imposto de Renda e o que tenho depositado ilegalmente no exterior.
- E, com tudo isso, o senhor continua roubando galinhas?
- Às vezes. Sabe como é.
- Não sei não, Excelência. Me explique.
- É que, em todas essas minhas atividades, eu sinto falta de uma coisa. O risco, entende? Daquela sensação de perigo, de estar fazendo uma coisa proibida, da iminência do castigo. Só roubando galinhas eu me sinto realmente um ladrão, e isso é excitante. Como agora. Fui preso, finalmente. Vou para a cadeia. É uma experiência nova.
- O que é isso, Excelência? O senhor não vai ser preso não.
- Mas fui pego em flagrante pulando a cerca do galinheiro!
- Sim. Mas primário, e com esses antecedentes...

sábado, 16 de junho de 2007

Banalização do compromisso (Helena Sut)

O menino aproximou-se tímido e, quase sem palavras, entregou uma aliança de compromisso. Uma revelação anunciada nos cantos da turminha do ensino fundamental. A menina sorriu como se ganhasse um troféu. Colocou o anel no dedo e, também sem palavras, correu para o grupo de amigas que testemunharam à declaração do infante apaixonado para se glorificar da conquista.

O coração da pequena de dez anos batia por outro, mas suas mãos ostentaram o pacto com o amor revelado, a rendição diante da valentia do pretendente. Ele não chegava a ser exatamente interessante, mas estava interessado. O namoro desenvolveu-se como são as primeiras impressões, distantes da realidade, ela valia-se de ser objeto do desejo do outro, ele gabava-se de já ser compromissado com uma das meninas bonitas da sala.

Alguns meses e o preterido deixou a timidez e lançou mão da mesma estratégia do adversário. Comprou um par de anéis de compromisso e, sem tomar conhecimento do brilho no dedo da menina, entregou sua confissão amorosa embrulhada num requintado estojo para artefatos de prata.

Alguma palpitação. A menina sorriu e sem constrangimento algum desnudou o dedo da primeira aliança e vestiu-se com o compromisso da segunda. Guardou o anel sem significado na mochila diante do olhar de todos e ostentou o novo brilho nas mãos como se houvesse vencido um novo campeonato.

O namorado desprezado ainda tentou reaver o anel. Quem sabe uma nova investida? Existiam outras meninas disponíveis na sala... Mas a pequena recusou-se a entregá-lo afirmando que “deu está dado”. Ele conformou-se e, após alguns dias, presenteou a próxima da lista com um anel similar.

Compromisso... A palavra perde o significado encerrada num guarda-jóias cheio de alianças abandonadas. As inquietações com a descoberta do amor, as dúvidas e as certezas são mascaradas como objetos. Quando crescer, provavelmente, a menina trocará de amores com a facilidade de quem troca de alianças. Se acomodará aos novos formatos sem se incomodar com a representação dos sentimentos. Guardará uma infinidade de relações, mas terá a alma vazia, pois não aprendeu a amar. Não conhecerá o respeito e a empatia, não se importará com os sentimentos alheios. Será sempre receptiva, mas nunca honesta. Usará as palavras sem interpretá-las, aceitará as relações sem reconhecer as promessas porque não conseguirá incorporar o elo das verdadeiras entregas.

Da Justiça à democracia, passando pelos sinos (José Saramago)

Começarei por vos contar em brevíssimas palavras um fato notável da vida camponesa ocorrido numa aldeia dos arredores de Florença há mais de quatrocentos anos. Permito-me pedir toda a vossa atenção para este importante acontecimento histórico porque, ao contrário do que é corrente, a lição moral extraível do episódio não terá de esperar o fim do relato, saltar-vos-á ao rosto não tarda.

Estavam os habitantes nas suas casas ou a trabalhar nos cultivos, entregue cada um aos seus afazeres e cuidados, quando de súbito se ouviu soar o sino da igreja. Naqueles piedosos tempos (estamos a falar de algo sucedido no século XVI) os sinos tocavam várias vezes ao longo do dia, e por esse lado não deveria haver motivo de estranheza, porém aquele sino dobrava melancolicamente a finados, e isso, sim, era surpreendente, uma vez que não constava que alguém da aldeia se encontrasse em vias de passamento. Saíram portanto as mulheres à rua, juntaram-se as crianças, deixaram os homens as lavouras e os misteres, e em pouco tempo estavam todos reunidos no adro da igreja, à espera de que lhes dissessem a quem deveriam chorar. O sino ainda tocou por alguns minutos mas, finalmente calou-se. Instantes depois a porta abria-se e um camponês aparecia no limiar. Ora, não sendo este o homem encarregado de tocar habitualmente o sino, compreende-se que os vizinhos lhe tenham perguntado onde se encontrava o sineiro e quem era o morto.

"O sineiro não está aqui, eu é que toquei o sino", foi a resposta do camponês.

"Mas então não morreu ninguém?", tornaram os vizinhos, e o camponês respondeu:

"Ninguém que tivesse nome e figura de gente, toquei a finados pela Justiça porque a Justiça está morta."

Que acontecera? Acontecera que o ganancioso senhor do lugar (algum conde ou marquês sem escrúpulos) andava desde há tempos a mudar de sítio os marcos das estremas das suas terras, metendo-os para dentro da pequena parcela do camponês, mais e mais reduzida a cada avançada. O lesado tinha começado por protestar e reclamar, depois implorou compaixão, e finalmente resolveu queixar-se às autoridades e acolher-se à proteção da justiça. Tudo sem resultado, a espoliação continuou. Então, desesperado, decidiu anunciar urbi et orbi (uma aldeia tem o exato tamanho do mundo para quem sempre nela viveu) a morte da Justiça. Talvez pensasse que o seu gesto de exaltada indignação lograria comover e pôr a tocar todos os sinos do universo, sem diferença de raças, credos e costumes, que todos eles, sem exceção, o acompanhariam no dobre a finados pela morte da Justiça, e não se calariam até que ela fosse ressuscitada. Um clamor tal, voando de casa em casa, de aldeia em aldeia, de cidade em cidade, saltando por cima das fronteiras, lançando pontes sonoras sobre os rios e os mares, por força haveria de acordar o mundo adormecido... Não sei o que sucedeu depois, não sei se o braço popular foi ajudar o camponês a repor as estremas nos seus sítios, ou se os vizinhos, uma vez que a Justiça havia sido declarada defunta, regressaram resignados, de cabeça baixa e alma sucumbida, à triste vida de todos os dias. É bem certo que a História nunca nos conta tudo...

Suponho ter sido esta a única vez que, em qualquer parte do mundo, um sino, uma campânula de bronze inerte, depois de tanto haver dobrado pela morte de seres humanos, chorou a morte da Justiça. Nunca mais tornou a ouvir-se aquele fúnebre dobre da aldeia de Florença, mas a Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria o mais exato e rigoroso sinônimo do ético, uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como indispensável à vida é o alimento do corpo. Uma justiça exercida pelos tribunais, sem dúvida, sempre que a isso os determinasse a lei, mas também, e sobretudo, uma justiça que fosse a emanação espontânea da própria sociedade em ação, uma justiça em que se manifestasse, como um iniludível imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que a cada ser humano assiste.

Mas os sinos, felizmente, não tocavam apenas para planger aqueles que morriam. Tocavam também para assinalar as horas do dia e da noite, para chamar à festa ou à devoção dos crentes, e houve um tempo, não tão distante assim, em que o seu toque a rebate era o que convocava o povo para acudir às catástrofes, às cheias e aos incêndios, aos desastres, a qualquer perigo que ameaçasse a comunidade. Hoje, o papel social dos sinos encontra-se limitado ao cumprimento das obrigações rituais e o gesto iluminado do camponês de Florença seria visto como obra desatinada de um louco ou, pior ainda, como simples caso de polícia. Outros e diferentes são os sinos que hoje defendem e afirmam a possibilidade, enfim, da implantação no mundo daquela justiça companheira dos homens, daquela justiça que é condição da felicidade do espírito e até, por mais surpreendente que possa parecer-nos, condição do próprio alimento do corpo. Houvesse essa justiça, e nem um só ser humano mais morreria de fome ou de tantas doenças que são curáveis para uns, mas não para outros. Houvesse essa justiça, e a existência não seria, para mais de metade da humanidade, a condenação terrível que objetivamente tem sido. Esses sinos novos cuja voz se vem espalhando, cada vez mais forte, por todo o mundo são os múltiplos movimentos de resistência e ação social que pugnam pelo estabelecimento de uma nova justiça distributiva e comutativa que todos os seres humanos possam chegar a reconhecer como intrinsecamente sua, uma justiça protetora da liberdade e do direito, não de nenhuma das suas negações. Tenho dito que para essa justiça dispomos já de um código de aplicação prática ao alcance de qualquer compreensão, e que esse código se encontra consignado desde há cinqüenta anos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aqueles trinta direitos básicos e essenciais de que hoje só vagamente se fala, quando não sistematicamente se silencia, mais desprezados e conspurcados nestes dias do que o foram, há quatrocentos anos, a propriedade e a liberdade do camponês de Florença. E também tenho dito que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tal qual se encontra redigida, e sem necessidade de lhe alterar sequer uma vírgula, poderia substituir com vantagem, no que respeita a retidão de princípios e clareza de objetivos, os programas de todos os partidos políticos do orbe, nomeadamente os da denominada esquerda, anquilosados em fórmulas caducas, alheios ou impotentes para enfrentar as realidades brutais do mundo atual, fechando os olhos às já evidentes e temíveis ameaças que o futuro está a preparar contra aquela dignidade racional e sensível que imaginávamos ser a suprema aspiração dos seres humanos. Acrescentarei que as mesmas razões que me levam a referir-me nestes termos aos partidos políticos em geral, as aplico por igual aos sindicatos locais, e, em conseqüência, ao movimento sindical internacional no seu conjunto. De um modo consciente ou inconsciente, o dócil e burocratizado sindicalismo que hoje nos resta é, em grande parte, responsável pelo adormecimento social decorrente do processo de globalização econômica em curso. Não me alegra dize-lo, mas não poderia calá-lo. E, ainda, se me autorizam a acrescentar algo da minha lavra particular às fábulas de La Fontaine, então direi que, se não interviermos a tempo, isto é, já, o rato dos direitos humanos acabará por ser implacavelmente devorado pelo gato da globalização econômica.

E a democracia, esse milenário invento de uns atenienses ingênuos para quem ela significaria, nas circunstâncias sociais e políticas específicas do tempo, e segundo a expressão consagrada, um governo do povo, pelo povo e para o povo? Ouço muitas vezes argumentar a pessoas sinceras, de boa fé comprovada, e a outras que essa aparência de benignidade têm interesse em simular, que, sendo embora uma evidência indesmentível o estado de catástrofe em que se encontra a maior parte do planeta, será precisamente no quadro de um sistema democrático geral que mais probabilidades teremos de chegar à consecução plena ou ao menos satisfatória dos direitos humanos. Nada mais certo, sob condição de que fosse efetivamente democrático o sistema de governo e de gestão da sociedade a que atualmente vimos chamando democracia. E não o é. É verdade que podemos votar, é verdade que podemos, por delegação da partícula de soberania que se nos reconhece como cidadãos eleitores e normalmente por via partidária, escolher os nossos representantes no parlamento, é verdade, enfim, que da relevância numérica de tais representações e das combinações políticas que a necessidade de uma maioria vier a impor sempre resultará um governo. Tudo isto é verdade, mas é igualmente verdade que a possibilidade de ação democrática começa e acaba aí. O eleitor poderá tirar do poder um governo que não lhe agrade e pôr outro no seu lugar, mas o seu voto não teve, não tem, nem nunca terá qualquer efeito visível sobre a única e real força que governa o mundo, e, portanto o seu país e a sua pessoa: refiro-me, obviamente, ao poder econômico, em particular à parte dele, sempre em aumento, gerida pelas empresas multinacionais de acordo com estratégias de domínio que nada têm que ver com aquele bem comum a que, por definição, a democracia aspira. Todos sabemos que é assim, e contudo, por uma espécie de automatismo verbal e mental que não nos deixa ver a nudez crua dos fatos, continuamos a falar de democracia como se se tratasse de algo vivo e atuante, quando dela pouco mais nos resta que um conjunto de formas ritualizadas, os inócuos passes e os gestos de uma espécie de missa laica. E não nos apercebemos, como se para isso não bastasse ter olhos, de que os nossos governos, esses que para o bem ou para o mal elegemos e de que somos portanto os primeiros responsáveis, se vão tornando cada vez mais em meros "comissários políticos" do poder econômico, com a objetiva missão de produzirem as leis que a esse poder convierem, para depois, envolvidas no açúcares da publicidade oficial e particular interessada, serem introduzidas no mercado social sem suscitar demasiados protestos, salvo os de certas conhecidas minorias eternamente descontentes...

Que fazer? Da literatura à ecologia, da fuga das galáxias ao efeito de estufa, do tratamento do lixo às congestões do tráfego, tudo se discute neste nosso mundo. Mas o sistema democrático, como se de um dado definitivamente adquirido se tratasse, intocável por natureza até à consumação dos séculos, esse não se discute. Ora, se não estou em erro, se não sou incapaz de somar dois e dois, então, entre tantas outras discussões necessárias ou indispensáveis, é urgente, antes que se nos torne demasiado tarde, promover um debate mundial sobre a democracia e as causas da sua decadência, sobre a intervenção dos cidadãos na vida política e social, sobre as relações entre os Estados e o poder econômico e financeiro mundial, sobre aquilo que afirma e aquilo que nega a democracia, sobre o direito à felicidade e a uma existência digna, sobre as misérias e as esperanças da humanidade, ou, falando com menos retórica, dos simples seres humanos que a compõem, um por um e todos juntos. Não há pior engano do que o daquele que a si mesmo se engana. E assim é que estamos vivendo.

Não tenho mais que dizer. Ou sim, apenas uma palavra para pedir um instante de silêncio. O camponês de Florença acaba de subir uma vez mais à torre da igreja, o sino vai tocar. Ouçamo-lo, por favor.

O rico pobre (Cristovam Buarque)

Em nenhum outro país os ricos demonstraram mais ostentação que no Brasil. Apesar disso, os brasileiros ricos são pobres. São pobres porque compram sofisticados automóveis importados, com todos os exagerados equipamentos da modernidade, mas ficam horas engarrafados ao lado dos ônibus de subúrbio. E, às vezes, são assaltados, seqüestrados ou mortos nos sinais de trânsito.


Presenteiam belos carros a seus filhos e não voltam a dormir tranqüilos enquanto eles não chegam em casa. Pagam fortunas para construir modernas mansões, desenhadas por arquitetos de renome, e são obrigados a escondê-las atrás de muralhas, como se vivessem nos tempos dos castelos medievais, dependendo de guardas que se revezam em turnos.


Os ricos brasileiros usufruem privadamente tudo o que a riqueza lhes oferece, mas vivem encalacrados na pobreza social. Na sexta-feira, saem de noite para jantar em restaurantes tão caros que os ricos da Europa não conseguiriam freqüentar, mas perdem o apetite diante da pobreza que ali por perto arregala os olhos pedindo um pouco de pão; ou são obrigados a freqüentar restaurantes fechados, cercados e protegidos por policiais privados. Quando terminam de comer escondidos, são obrigados a tomar o carro na porta, trazido por um manobrista, sem o prazer de caminhar pela rua, ir a um cinema ou teatro, depois continuar até um bar para conversar sobre o que viram.


Mesmo assim, não é raro que o pobre rico seja assaltado antes de terminar o jantar, ou depois, na estrada a caminho de casa. Felizmente isso nem sempre acontece, mas certamente a viagem é um susto durante todo o caminho. E, às vezes, o sobressalto continua, mesmo dentro de casa.


Os ricos brasileiros são pobres de tanto medo. Por mais riquezas que acumulem no presente, são pobres na falta de segurança para usufruir o patrimônio no futuro. E vivem no susto permanente diante das incertezas em que os filhos crescerão.


Os ricos brasileiros continuam pobres de tanto gastar dinheiro apenas para corrigir os desacertos criados pela desigualdade que suas riquezas provocam: em insegurança e ineficiência. No lugar de usufruir tudo aquilo com que gastam, uma parte considerável do dinheiro nada adquire, serve apenas para evitar perdas.


Por causa da pobreza ao redor, os brasileiros ricos vivem um paradoxo: para ficarem mais ricos tem de perder dinheiro, gastando cada vez mais apenas para se proteger da realidade hostil e ineficiente.


Quando viajam ao exterior, os ricos sabem que no hotel onde se hospedarão serão vistos como assassinos de crianças na Candelária, destruidores da Floresta Amazônica, usurpadores da maior concentração de renda do planeta, portadores de malária, de dengue e de verminoses. São ricos empobrecidos pela vergonha que sentem ao serem vistos pelos olhos estrangeiros.


Na verdade, a maior pobreza dos ricos brasileiros está na incapacidade de verem a riqueza que há nos pobres. Foi esta pobreza de visão que impediu os ricos brasileiros de perceberem, cem anos atrás, a riqueza que havia nos braços dos escravos libertos se lhes fosse dado direito de trabalhar a imensa quantidade de terra ociosa de que o país dispunha. Se tivessem percebido essa riqueza e libertado a terra junto com os escravos, os ricos brasileiros teriam abolido a pobreza que os acompanha ao longo de mais de um século.


Se os latifúndios tivessem sido colocados à disposição dos braços dos ex-escravos, a riqueza criada teria chegado aos ricos de hoje, que viveriam em cidades sem o peso da imigração descontrolada e com uma população sem miséria.


A pobreza de visão dos ricos impediu também de verem a riqueza que há na cabeça de um povo educado. Ao longo de toda a nossa história, os nossos ricos abandonaram a educação do povo, desviaram os recursos para criar a riqueza que seria só deles, e ficaram pobres: contratam trabalhadores com baixa produtividade, investem em modernos equipamentos e não encontram quem os saiba manejar, vivem rodeados de compatriotas que não sabem ler o mundo ao redor, não sabem mudar o mundo, não sabem construir um novo país que beneficie a todos. Muito mais ricos seriam os ricos se vivessem numa sociedade onde todos fossem educados.


Para poderem usar os seus caros automóveis, os ricos construíram viadutos com dinheiro de colocar água e esgoto nas cidades, achando que, ao comprar água mineral, se protegiam das doenças dos pobres. Esqueceram-se de que precisam desses pobres e não podem contar com eles todos os dias e com toda saúde, porque eles (os pobres) vivem sem água e sem esgoto. Montam modernos hospitais, mas tem dificuldades em evitar infecções porque os pobres trazem de casa os germes que os contaminam. Com a pobreza de achar que poderiam ficar ricos sozinhos, construíram um país doente e vivem no meio da doença.


Há um grave quadro de pobreza entre os ricos brasileiros. E esta pobreza é tão grave que a maior parte deles não percebe. Por isso a pobreza de espírito tem sido o maior inspirador das decisões governamentais das pobres ricas elites brasileiras.


Se percebessem a riqueza potencial que há nos braços e nos cérebros dos pobres, os ricos brasileiros poderiam reorientar o modelo de desenvolvimento em direção aos interesses de nossas massas populares. Liberariam a terra para os trabalhadores rurais, realizariam um programa de construção de casas e implantação de redes de água e esgoto, contratariam centenas de milhares de professores e colocariam o povo para produzir para o próprio povo. Esta seria uma decisão que enriqueceria o Brasil inteiro - os pobres que sairiam da pobreza e os ricos que sairiam da vergonha, da insegurança e da insensatez. Mas isso é esperar demais. Os ricos são tão pobres que não percebem a triste pobreza em que usufruem suas malditas riquezas.

sábado, 9 de junho de 2007

O meu país (Zé Ramalho)

Tô vendo tudo, tô vendo tudo
Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo

Um país que crianças elimina
Que não ouve o clamor dos esquecidos
Onde nunca os humildes são ouvidos
E uma elite sem deus é quem domina
Que permite um estupro em cada esquina
E a certeza da dúvida infeliz
Onde quem tem razão baixa a cerviz
E massacram - se o negro e a mulher
Pode ser o país de quem quiser
Mas não é, com certeza, o meu país

Um país onde as leis são descartáveis
Por ausência de códigos corretos
Com quarenta milhões de analfabetos
E maior multidão de miseráveis
Um país onde os homens confiáveis
Não têm voz, não têm vez, nem diretriz
Mas corruptos têm voz e vez e bis
E o respaldo de estímulo incomum
Pode ser o país de qualquer um
Mas não é, com certeza, o meu país

Um país que perdeu a identidade
Sepultou o idioma português
Aprendeu a falar pornofonês
Aderindo à global vulgaridade
Um país que não tem capacidade
De saber o que pensa e o que diz
Que não pode esconder a cicatriz
De um povo de bem que vive mal
Pode ser o país do carnaval
Mas não é, com certeza, o meu país

Um país que seus índios discrimina
E as ciências e as artes não respeita
Um país que ainda morre de maleita
Por atraso geral da medicina
Um país onde escola não ensina
E hospital não dispõe de raio-X
Onde a gente dos morros é feliz
Se tem água de chuva e luz do sol
Pode ser o país do futebol
Mas não é, com certeza, o meu país

Tô vendo tudo, tô vendo tudo
Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo

Um país que é doente e não se cura
Quer ficar sempre no terceiro mundo
Que do poço fatal chegou ao fundo
Sem saber emergir da noite escura
Um país que engoliu a compostura
Atendendo a políticos sutis
Que dividem o Brasil em mil brasis
Pra melhor assaltar de ponta a ponta
Pode ser o país do faz-de-conta
Mas não, é com certeza, o meu país

Tô vendo tudo, tô vendo tudo
Mas, bico calado, faz de conta que sou mudo

Sinto vergonha de mim (Rui Barbosa)

Sinto vergonha de mim
por ter sido educador de parte desse povo,
por ter batalhado sempre pela justiça,
por compactuar com a honestidade,
por primar pela verdade
e por ver este povo já chamado varonil
enveredar pelo caminho da desonra.

Sinto vergonha de mim por ter feito parte de uma era que lutou pela democracia,
pela liberdade de ser
e ter que entregar aos meus filhos,
simples e abominavelmente,
a derrota das virtudes pelos vícios,
a ausência da sensatez no julgamento da verdade,
a negligência com a família, célula-mater da sociedade,
a demasiada preocupação com o "eu" feliz a qualquer custo,
buscando a tal "felicidade" em caminhos eivados de desrespeito para com o seu próximo.

Tenho vergonha de mim pela passividade em ouvir,
sem despejar meu verbo,
a tantas desculpas ditadas pelo orgulho e vaidade,
a tanta falta de humildade para reconhecer um erro cometido,
a tantos "floreios" para justificar atos criminosos,
a tanta relutância em esquecer a antiga posição de sempre "contestar",
voltar atrás e mudar o futuro.

Tenho vergonha de mim
pois faço parte de um povo que não reconheço,
enveredando por caminhos que não quero percorrer...

Tenho vergonha da minha impotência,
da minha falta de garra,
das minhas desilusões e do meu cansaço.

Não tenho para onde ir
pois amo este meu chão,
vibro ao ouvir meu Hino
e jamais usei a minha Bandeira para enxugar o meu suor
ou enrolar meu corpo na pecaminosa manifestação de nacionalidade.

Ao lado da vergonha de mim, tenho tanta pena de ti, povo brasileiro!

De tanto ver triunfar as nulidades,
de tanto ver prosperar a desonra,
de tanto ver crescer a injustiça,
de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude,
a rir-se da honra,
a ter vergonha de ser honesto.

Eu entendi (William Shakespeare)

Eu entendi:
Que não posso exigir o amor de ninguém, posso apenas dar boas razões para que gostem de mim e ter paciência para que a vida faça o resto;
Que não importa o quanto certas coisas são importantes para mim, tem gente que não dá a mínima e jamais conseguirei convencê-las que posso passar anos construindo uma verdade e destruí-la em apenas alguns segundos.

Eu entendi:
Que posso fazer algo em um minuto e ter que responder por isso o resto da minha vida;
Que por mais que você corte o pão em fatias, esse pão continua tendo duas faces, e o mesmo vale para tudo o que cortamos de nosso caminho.

Eu entendi:
Que vai demorar muito para me transformar na pessoa que quero ser, e devo ter paciência;
Que posso ir além dos limites que eu próprio coloquei;
Que eu preciso escolher entre controlar meus pensamentos ou de ser controlado por eles.

Eu entendi:
Que os heróis são pessoas que fazem o que acham que devem fazer naquele momento, independentemente do medo que sentem;
Que perdoar exige muita prática; condenar é mais fácil!
Que há muita gente que gosta de mim, mas que não conseguem expressar isso.

Eu entendi:
Que nos momentos mais difíceis, a ajuda veio justamente daquela pessoa que eu achava que iria tentar piorar a minha vida;
Que eu posso ficar furioso, tenho o direito de me irritar, mas não tenho o direito de ser cruel;
Que jamais posso dizer a uma criança que seus sonhos são impossíveis. Será uma tragédia para o mundo se eu conseguir convencê-la disso.

Eu entendi:
Que meu melhor amigo vai me machucar de vez em quando, que eu tenho que me acostumar com isso;
Que não é bastante ser perdoado pelo outros, eu preciso me perdoar primeiro;
Que, não importa o quanto meu coração esteja sofrendo, o mundo não vai parar por causa disso.

Eu entendi:
Que as circunstâncias de minha infância são responsáveis pelo que eu sou, mas não pelas minhas escolhas que eu fiz quando adulto;
Que numa briga, eu preciso escolher de que lado estou, mesmo quando não quero me envolver;
Que, quando duas pessoas discutem não significa que elas se odeiem. E quando duas pessoas não discutem não significa que elas se amem.

Eu entendi:
Que por mais eu queira proteger meus filhos, eles vão se machucar e eu também serei machucado, isso faz parte da vida;
Que minha existência pode mudar para sempre em poucas horas, por causa de gente que nunca vi antes;
Que diplomas na parede não me fazem mais respeitável ou mais sábio.

Eu entendi:
Que a palavra amor perde o sentido quando usada sem critério;
Que certas pessoas vão embora de qualquer maneira, quer você queira ou não;
Que é difícil traçar uma linha entre ser gentil, não ferir pessoas, e saber lutar pelas coisas que acredita.

domingo, 3 de junho de 2007

Precisa-se de matéria-prima para construir um país (João Ubaldo Ribeiro)

A crença geral anterior era que Collor não servia, bem como Itamar e Fernando Henrique. Agora dizemos que Lula não serve. E o que vier depois de Lula também não servirá para nada. Por isso estou começando a suspeitar que o problema não está no ladrão e corrupto que foi Collor, ou na farsa que é o Lula. O problema está em nós. Nós como povo. Nós como matéria prima de um país.


Porque pertenço a um país onde a "esperteza" é a moeda que sempre é valorizada, tanto ou mais do que o dólar. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família, baseada em valores e respeito aos demais. Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nas calçadas onde se paga por um só jornal e se tira um só jornal, deixando os demais onde estão. Pertenço ao país onde as "empresas privadas" são papelarias particulares de seus empregados desonestos, que levam para casa, como se fosse correto, folhas de papel, lápis, canetas, clipes e tudo o que possa ser útil para o trabalho dos filhos... e para eles mesmos.


Pertenço a um país onde a gente se sente o máximo porque conseguiu "puxar" a tevê a cabo do vizinho, onde a gente frauda a declaração de imposto de renda para não pagar ou pagar menos impostos. Pertenço a um país onde a impontualidade é um hábito. Onde os diretores das empresas não valorizam o capital humano. Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos.


Onde fazemos "gatos" para roubarmos luz e água e nos queixamos de como esses serviços estão caros. Onde não existe a cultura pela leitura (exemplo maior é nosso atual Presidente, que recentemente falou que é "muito chato ter que ler") e não há consciência nem memória política, histórica nem econômica.


Onde nossos congressistas trabalham dois dias por semana para aprovar projetos e leis que só servem para afundar ao que não tem, encher o saco ao que tem pouco e beneficiar só a alguns. Pertenço a um país onde as carteiras de motorista e os certificados médicos podem ser "comprados", sem fazer nenhum exame. Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no ônibus, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar o lugar.


Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o pedestre. Um país onde fazemos um monte de coisa errada, mas nos esbaldamos em criticar nossos governantes. Quanto mais analiso os defeitos do Fernando Henrique e do Lula, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem "molhei" a mão de um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Dirceu é culpado, melhor sou eu como brasileiro, apesar que ainda hoje de manhã passei para trás um cliente através de uma fraude, o que me ajudou a pagar algumas dívidas.


Não. Não. Não. Já basta!


Como "matéria prima" de um país, temos muitas coisas boas, mas nos falta muito para sermos os homens e mulheres que nosso país precisa.


Esses defeitos, essa "esperteza brasileira" congênita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até converter-se em casos de escândalo, essa falta de qualidade humana, mais do que Collor, Itamar, Fernando Henrique ou Lula, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são brasileiros como nós, eleitos por nós. Nascidos aqui, não em outra parte...


Me entristeço. Porque, ainda que Lula renunciasse hoje mesmo, o próximo Presidente que o suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos. E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém o possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Collor, nem serviu Itamar, não serviu Fernando Henrique, e nem serve Lula, nem servirá o que vier.


Qual é a alternativa? Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror?


Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa "outra coisa" não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados... igualmente sacaneados!!!


É muito gostoso ser brasileiro. Mas quando essa brasilidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, aí a coisa muda...


Não esperemos acender uma vela a todos os Santos, a ver se nos mandam um Messias. Nós temos que mudar, um novo governador com os mesmos brasileiros não poderá fazer nada. Está muito claro... Somos nós os que temos que mudar.


Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda nos acontecendo: desculpamos a mediocridade mediante programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. É a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore seu comportamento e que não se faça de surdo, de desentendido...


Sim, decidi procurar ao responsável e estou seguro que o encontrarei quando me olhar no espelho.


Aí está. Não preciso procurá-lo em outro lado. E você, o que pensa?


Medite!!!

A cidadania está morta (Bruno Momesso Bertolo)

Observe a imagem ao lado (clique para ampliar). O “cidadão” (para não dizer inúmeros pejorativos, mas escolha aqueles que julgar melhor) revela profundo menosprezo ao próximo no momento em que “estacionou” (pois sequer preocupou-se em manobrar) sobre duas vagas. Se não bastasse, aludidas vagas eram destinadas aos portadores de necessidades especiais.

É deveras improvável que se trate de um portador de deficiências. Se porventura fosse, certamente não agiria assim, exatamente por conhecer os percalços da vida de um indivíduo portador de necessidades especiais. A deficiência que o proprietário da camionete possui é moral, contudo, não pode valer-se disso para ter regalias. Muito pelo contrário. Deveria ser severamente punido.

Eis um exemplo emblemático do maior problema que assola o Brasil: a ausência de cidadania. As ocorrências são, lamentavelmente, cada vez mais corriqueiras e integram um rol extenso: falta de educação no trânsito, desrespeito ao meio ambiente, alienação de toda espécie, fezes de cães nas calçadas, carrinhos de supermercados largados fora do local onde estavam, som alto de madrugada (principalmente em automóveis), pichações, depredação dos patrimônios públicos e privados, entre outros.

E o que é pior: tudo é tratado com a maior naturalidade. Se você aponta ou reclama, ainda é repreendido e/ou então ofendido pelo transgressor moral, que acredita, pasmem, estar dentro de seus direitos! Chega a ser surreal.

O que ocorre na cabeça de tais pessoas? Desconhecem ou ignoram valores como respeito, educação e cidadania? Não foram criadas dentro de tais preceitos ou tornaram-se assim durante a vida (que, ao que parece, nada lhes ensinou)? Para que ajam como civilidade será necessário haver a respectiva punição a quem não observar determinadas regras morais?

E alguns casos (arremessar lixo de veículo automotor, som alto, pichações, depredações, etc.) já são sancionados exatamente por isso. Ainda assim de nada adianta, especialmente em razão da conhecida impunidade que grassa no país. Diz-se que é possível medir o desenvolvimento de uma nação de acordo com o número de leis existentes: quanto mais leis, menos desenvolvida. Nem preciso dizer onde o Brasil se encaixa, né?

Diante do quadro supramencionado, não é de se admirar os casos de corrupção que inundam os noticiários e proliferam pelo Brasil. Reflexo da população. Tanto é assim que, em pesquisa realizada ano passado, 75% dos brasileiros entrevistados admitiram que seriam capazes de cometer alguma irregularidade em cargos públicos. Além de potencialmente corruptos, são hipócritas! Como alguém assim pode censurar os atos de improbidade administrativa? Mas o fazem...

Em uma conversa recente, uma amiga contou-me um exemplo absurdo. Ao visitar a escola em que estudou há aproximadamente 20 anos, percebeu que os lados internos dos muros estavam pichados, algo que estranhou, sendo que, ao perguntar o motivo das “obras de arte”, obteve como resposta: “Ah, para que os alunos não pichem por fora, decidimos autorizá-los a pichar por dentro”. Como é que é? Que valores estão cultivando nessa geração? Qual o lema utilizado? “Para que não faça algo errado, permitiremos que o faça”? Futuro tenebroso nos aguarda.

Longe de ser saudosista (mesmo porque sequer tenho idade para tanto), mas há 15 anos os valores eram outros. Havia, indubitavelmente, mais respeito, solidariedade e cidadania. Ao que tudo indica, o ser humano tem dificuldade em ao menos buscar o equilíbrio. Talvez por isso Aristóteles já vaticinava que “a virtude está no meio termo” (entre o excesso e a carência). Explico.

Antigamente (refiro-me à geração de 50), a educação era austera, impositiva e repressiva, de modo que os pais impunham suas vontades e aos filhos cabiam obedecer. Com o passar dos anos, muita coisa mudou e, espontaneamente, os pais das gerações subseqüentes (80, 90 e 2000) concederam aos filhos direitos que lhes foram cerceados e/ou negados. Perfeitamente compreensível e normal.

Todavia, há um problema: muitos genitores resolveram conferir todos os direitos e, em contrapartida, escassos deveres. Vivemos sob o “slogan” do “é proibido proibir”. A maioria dos pais não impõe limites, alguns atendem a todos os anseios dos filhos e outros são até mesmo submissos a eles. Adotou-se o outro extremo, qual seja, o da liberdade incondicional. Tudo é justificado com fundamento no mote “são jovens e têm que aproveitar”. Criam-se os monstros e, quando algo ruim ocorre, ainda soltam a célebre pérola: “Onde foi que errei?”. Tenha dó!

O resultado está aí! Uma sociedade desregrada, individualista e desprovida de cidadania. Só nos resta esperar que haja o resgate do que é necessário para modificar nefasta situação. Depende de nós...

"Se você agir sempre com dignidade, talvez não consiga mudar o mundo, mas será um canalha a menos". John F. Kennedy

Introdução (Bruno Momesso Bertolo)

Por onde começar? O que dizer? E para quem?

Começarei do início (meio óbvio, né?), direi o necessário (se não me empolgar, hahaha!) e àqueles que quiserem ouvir (sei de antemão que serão bem poucos, mas espero não pregar no deserto).

Não pretendia criar um “blog”. Acreditava que demandaria muito tempo e que seria efêmero, portanto, dispensável. Entretanto, alguns amigos incentivavam e concluí, recentemente, que seria interessante possuir um espaço para publicar, vez ou outra, alguns comentários sobre diversos assuntos.

Minhas idéias serão secundárias e esporádicas. A principal razão de ser do presente “blog” é compartilhar textos que tenho guardado, pois acredito que seria um equívoco não difundi-los, sobretudo por serem excelentes e propiciarem a reflexão, algo muito raro atualmente.

Assim sendo, o “blog” abordará vários temas, não se restringindo a uma pauta pré-estabelecida. De forma alguma. E o mais importante: será uma via de mão dupla. Críticas, sugestões e comentários não serão apenas bem vindos, mas almejados.

Afinal, não aspiro modificar opiniões, por mais que não concorde com elas. O intuito é tão-somente provocar a ponderação de idéias. E, se ao menos uma pessoa meditar com o que será publicado aqui, então este “blog” terá cumprido a sua finalidade.

Saudações!