domingo, 28 de dezembro de 2008

Receita de Ano Novo (Carlos Drummond de Andrade)

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens? passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Crime passional não ocorre por impulso (Luiza Nagib Eluf)

Depois de cem horas em cativeiro, acompanhadas de perto por toda a população brasileira pelo rádio, televisão e jornais, terminou o cárcere privado da menina Eloá Cristina Pimentel, assassinada por seu ex-namorado Lindemberg Alves, pondo fim a mais essa crônica de uma morte anunciada. Eloá não foi um caso isolado de homicídio passional. Foi, apenas, mais um.

Importa esclarecer que passionalidade não se confunde com violenta emoção. O termo "passional" deriva de paixão, que é diferente de emoção e de amor. Não é um homicídio de impulso, ao contrário, é detalhadamente planejado, exatamente como fez Lindemberg. Ele foi à casa de Eloá preparado para acertar as contas, armado até os dentes para fazer o que fosse necessário a fim de alcançar o seu objetivo: vingança. O intento era eliminar a moça para aliviar os sentimentos de rejeição e de masculinidade ferida que o atormentavam.

Por essa razão, a negociação que se estabeleceu durante todo o período de cativeiro não teria a menor chance de prosperar. Lindemberg não queria dinheiro, não queria garantir sua fuga. Pretendia matar Eloá e qualquer outra pessoa que se interpusesse no seu caminho. Evidentemente, Lindemberg premeditou todos os seus passos. Eloá foi pega de surpresa e tornou-se cativa sem muito esforço.

O crime passional até pode resultar de um impulso no caso de o agressor ser surpreendido por uma situação inusitada e reagir imediatamente, sem tempo para pensar. Um exemplo disso seria o marido chegar em casa e surpreender sua mulher na cama com outro homem. Tomado de espanto e fúria homicida, poderia reagir de forma impensada, resultante de violenta emoção, logo após injusta provocação da vítima. Ainda assim, teríamos que considerar o fato da mulher estar na cama com outro como sendo "injusta provocação", o que é discutível, tendo em vista que a intenção de quem pratica um ato sexual não é necessariamente provocar alguém.

É crucial entender melhor o crime passional e a força que move seu autor. Por que o homem precisa matar a mulher que o rejeita? Não seria suficiente separar-se dela e arrumar outra? Por que tantos homens aparentemente normais e pacíficos reagem de forma brutal e rancorosa quando são desprezados ou simplesmente substituídos? Foi assim com Pimenta Neves e Sandra Gomide, Doca Street e Ângela Diniz, Lindomar Castilho e Eliane de Gramont, Euclides da Cunha e Ana Ribeiro. São numerosos os casos de homicídio passional ao longo da história de nosso país, mas muito pouco se discute sobre eles.

Na conduta do criminoso passional encontra-se embutida uma causa exógena, ou seja, uma pressão social para que ele não aceite a autodeterminação da mulher. Além do fato em si de ter sido desprezado, o passional preocupa-se em mostrar aos amigos e familiares que ainda continua no comando de sua relação amorosa e que castigou com rigor aquela que ousou desafiá-lo. É a face deplorável do machismo. Por essa razão, o sujeito comete o crime na presença de testemunhas e, depois, confessa a autoria do delito sem rodeios e em detalhes. Para ele, praticar o ajuste de contas e não demonstrá-lo publicamente de nada adianta.

Nosso Código Penal não define o que é "crime passional", nem faz previsão expressa desse tipo. A doutrina é que assim denomina a conduta do homem que mata a mulher por suspeita de infidelidade. É importante mostrar que o homicídio passional, em regra, é qualificado, não, privilegiado. Qualificado pelo motivo que é torpe (vingança), pelo uso de recurso que dificulta ou impede a defesa da vítima (surpresa), pelo emprego de meio cruel (vários tiros ou facadas no rosto, no abdome, na virilha). Não é privilegiado porque, na grande maioria dos casos, o agente não se encontra sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima. O sujeito pode, até, estar sentindo uma forte emoção no momento do crime, mas é uma emoção que foi sendo depurada e aumentada ao longo do tempo. Ou seja, o agente teve a oportunidade de pensar melhor, de procurar acalmar-se para evitar o crime, mas deliberadamente não o fez. Tomado de ódio, e apesar de todas as conseqüências de seu ato, que ele bem conhece, decide matar e trama sua ação de forma a emboscar a vítima.

É evidente que o passional vai dizer que "matou por amor, movido por impulso incontrolável". Com todas as provas contra si, nada lhe resta a declarar. No entanto, é óbvio que ninguém mata por amor e que a premeditação exclui a violenta emoção prevista no parágrafo 1º do art. 121 do Código Penal. Lindemberg, durante as conversas que manteve com o irmão da moça e que foram gravadas pela polícia, informou que "estava com ódio de Eloá, que não conseguia nem olhar para a cara dela". É claro. Se não se sentisse assim, por que iria matá-la?

domingo, 14 de dezembro de 2008

Por que o sonho do casamento se transforma num pesadelo inexplicável? (Rosana Braga)

Por mais que os tempos tenham mudado, é preciso admitir: muitas pessoas ainda apostam no casamento como uma oportunidade de ser feliz ao lado da pessoa amada. Homens e mulheres decidem viver juntos para que possam desfrutar de intimidade, alegrias, responsabilidades, amor, filhos, enfim, para que possam constituir uma família e se sentirem realizados, amparados e, de certa forma, até protegidos. Sim, porque apesar das pessoas continuarem se casando, a cada dia me parece que esta é uma condição em extinção. Nunca foi tão grande o número de divórcios, sem falar nos que se arrastam por anos a fio em casamentos falidos.

Por outro lado, existem também aquelas pessoas que abominam o casamento de tal forma que parecem estar fugindo da morte. Não acreditam, em hipótese alguma, que possa haver sequer um casamento satisfatório, uma relação enriquecedora, um amor que tenha sobrevivido às armadilhas da convivência diária.

Mas a verdade é que realmente existem casamentos que se transformam num martírio, numa tortura e chegam à beira do insuportável. No entanto, é também absolutamente verdade que existem casamentos felizes, casais que se complementam, que realizam grandes conquistas juntos e que se amam cada vez mais!

Então, qual é a diferença entre um caso e outro? Por que alguns casamentos dão certo e outros causam tanto sofrimentos aos envolvidos? Por que alguns casais conseguem se entender e outros parecem viver em função de se agredir, se provocar e se destruir?

Bom, eu começaria dizendo que, salvo raras exceções, não acredito que duas pessoas se casem já com esta intenção. Sendo assim, me parece que os problemas surgem com o tempo, com um desentendimento bobo hoje, uma desavença sem muita importância amanhã, mais uma cobrança, outra crítica, o cansaço, a falta de dinheiro, o filho que adoece, enfim, pequenas situações que, juntas, se transformam em mágoas, em falta de paciência, de afeto, de compreensão e, por fim, a falta de vontade, de motivação (ou de motivos?) para continuarem juntos! E aí, assumidamente ou não, desistem do amor que sentiam um pelo outro e transformam o casamento numa grande chatice, num peso enorme!

O que fazer? Muitas coisas podem ser feitas, mas como não eu conseguiria escrever tudo numa coluna só, vou falar sobre uma das atitudes mais importantes: não há amor que sobreviva sem cuidados diários. Não há casamento que resista sem investimentos constantes, sem dedicação, sem atenção e, sobretudo, muito diálogo! Deus nos concedeu uma boca e o dom da palavra para falarmos sobre nossos sentimentos, para conversarmos sobre o que tem nos desagradado, mas também – e principalmente – para elogiarmos as pessoas que amamos, para lembrá-las do quanto elas são importante para nós, do quando nossa vida é melhor e mais bonita por podermos contar com elas... Mas será que os casais fazem isso desde o primeiro dia que se casam? Será que fazem isso todos os dias ou imediatamente após se sentirem desapontadas com alguma situação? Ou será que vão “engolindo” suas insatisfações durante muito tempo, até o dia em que já não conseguem mais suportar e despejam um monte de acusações, cobranças, agressões, dores, mágoas e insatisfações sobre o outro?

Pois eu garanto que o casal que se comprometer com o diálogo, incluindo essas duas regrinhas, ou seja, expondo na hora o que não lhe agradou e, por outro lado, lembrando sempre o outro de suas qualidades com declarações, elogios e comentários que ressaltam suas atitudes positivas, conseguirá alimentar o seu amor a cada dia e transformá-lo numa relação forte, sincera, que vale a pena ser mantida!

É muito importante lembrar que todos nós gostamos de ser elogiados, de ser notados e reconhecidos pelo que fazemos de bom, nem que seja uma comidinha gostosa, uma casa cheirosa, uma flor trazida da rua, um bilhetinho deixado na geladeira, um comentário sobre um sorriso, uma brincadeira, enfim, se observarmos bem, encontraremos muitos motivos para fazer um elogio à pessoa amada.

Então, se você quer ser feliz no seu casamento, alimente a relação com palavras e atitudes positivas e nunca abandone o diálogo. Converse sempre, muito, todos os dias, nem que seja um pouquinho, nem que seja por telefone, nem que seja por bilhetes, mas converse, pois é somente através do diálogo que você pode manter a ponte que une o seu mundo ao mundo da pessoa amada. Sem diálogo não há união e, sem união, a chama do amor se apaga...

domingo, 7 de dezembro de 2008

Receita de alegria (Pablo Picasso)

Joga fora todos os números não essenciais para tua sobrevivência. Isto inclui: idade, peso e altura. Que eles preocupem ao médico. Para isto o pagamos. Conviva, de preferência, com amigos alegres. Os pessimistas não são convenientes para ti.

Continua aprendendo... Aprenda mais sobre computadores, artesanato, jardinagem, qualquer coisa... Não deixe teu cérebro desocupado. Uma mente sem uso é oficina do diabo. E o nome do diabo é "Alzheimer".

Ria sempre, muito e alto. Ria até não poder mais. Inclusive de ti mesmo! Quando as lágrimas chegarem: agüenta, sofre e... Segue adiante.

Agradeça cada dia que amanhece como uma nova oportunidade para fazer aquilo que ainda não tiveste coragem de começar. Do princípio ao fim. Prefira novos caminhos a voltar a caminhos mil vezes trilhados.

Apaga o cinza de tua vida. E acenda as cores que carregas dentro de ti. Desperta teus sentidos para que não percas tudo de belo e formoso que te cerca.

Contagia de alegria ao teu redor, e tenta ir além das fronteiras pessoais a que tenhas chegado aprisionado pelo tempo.

Porém lembra-te: a única pessoa que te acompanha a vida inteira és tu mesmo. Cerca-te daquilo que gostas: família, animais, lembranças, música, plantas, um hobby, seja o que for...

Teu lar é teu refúgio, porém não fiques trancado nele. Teu melhor capital, a saúde. Aproveite-a. Se é boa, não a desperdice; se não é, não a estrague mais.

Não se renda à nostalgia. Sai à rua. Vá à uma cidade vizinha, a um país estrangeiro... Porém não viaja ao passado porque, dói!

Diz aos que amas, que realmente os amas e faça isso em todas as oportunidades que tiver. E lembra-te sempre que a vida não se mede pelo número de vezes que respirastes, mas pelos momentos que teu coração palpitou forte: de muito rir, de surpresa, de êxtase, de felicidade... E, sobretudo, de amar sem medida.

Há pessoas que transformam o Sol em uma pequena mancha amarela, porém há também as que fazem de uma simples mancha amarela o próprio Sol.